sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Kosovo

Parece que o Governo Português se prepara para, em breve, talvez já na terça-feira, reconhecer a independência do Kosovo. Apesar de ter sido daqueles que concordou com a recusa inicial de Lisboa em dar esse passo em Fevereiro, penso que, agora, esta é uma decisão compreensível. E porquê?

Essencialmente, porque a política não é o que nós gostaríamos que fosse, mas sim aquilo que é. De facto, no plano dos princípios a nossa posição de não reconhecimento é muito confortável, já que temos o Direito Internacional do nosso lado. E, para um país como Portugal, o Direito Internacional é uma arma diplomática fundamental. Não temos outra, seja ela militar ou mesmo económica. Só pugnando por uma defesa intransigente do Direito Internacional é que garantiremos o respeito pelos compromissos internacionais - não pela razão da força, mas sim pela força da razão.

Há, contudo, outras razões a ter em conta, que se sobrepõem àquela:

- todos os nossos Aliados, com excepções em Madrid, Bratislava, Atenas, Nicósia e Bucareste (por razões que não se nos aplicam) reconheceram a independência. Não se trata aqui de defender uma política de Maria-vai-com-todos. Trata-se, somente, de reconhecer que estamos desalinhados do nosso centro político natural. E porquê? Países da nossa dimensão, para quem o Direito Internacional e a defesa dos seus princípios, é tão ou mais fundamental do que para nós, já reconheceram o Kosovo. Lisboa continua numa posição, não de intransigência, mas de reflexão, que não é, de todo, confortável. A decisão não foi de não reconhecer nunca. Foi a de não reconhecer por enquanto. Ora, já vimos como a situação evoluiu no terreno e eventuais reticências que pudessem existir no passado não se confirmaram no presente;

- Portugal participou na campanha aérea da OTAN de 1999 que nos conduziu, em última análise, à situação actual. Porquê, agora, continuar a sublinhar a perenidade de certos princípios que, na altura, não nos toldaram a acção?

- a situação no e do Kosovo é, de facto, sui generis. A própria Rússia, que até há pouco tempo mantinha uma certa superioridade moral nesta questão (que perdeu quando reconheceu a Abcázia e a Ossétia do Sul), hesita em fazer paralelismos entre as duas situações.

É certo que o timing da decisão do Governo português pode não ser o melhor, atendendo à situação no Cáucaso, mas os custos do não reconhecimento parecem, e aqui há que acreditar no que diz o Governo, ultrapassar, largamente, os custos da manutenção da actual situação... Como diria o outro, I go to bed an idealist, but wake up a realist!