domingo, 30 de dezembro de 2007

Ainda o Paquistão

Retomo também eu a escrita no blog na senda do último post do Otto. O Paquistão, pelos piores motivos, salvou as edições de muitos jornais e televisões, que, sem o assassinato da Sra. Bhutto, se veriam obrigados às típicas reportagens sobre pacotes de final-de-ano, mortes nas estradas, alguns desastres naturais e pouco mais. Já nem as férias dos políticos nos salvam, agora que são mantidas em segredo. Em abono da verdade, contudo, esta parece ser uma época (entre o Natal e o fim de ano) em que cada vez mais se passam coisas (demissão do Presidente Yeltsin na véspera do Ano Novo; enforcamento de Saddam; tsunami;...). Mas é sobre o Paquistão e a Sra. Bhutto em particular que quero dizer algumas coisas.

Em primeiro lugar, assistimos, com o seu assassinato, a um fenómeno sempre muito curioso e recorrente: de pessoa por muitos criticada, a Sra. Bhutto é, desde que morreu, a possível-melhor-coisa-que-poderia-eventualmente-ter-acontecido-ao-Paquistão. É extraordinário. Para o Ocidente, e os EUA em particular, percebe-se que esta seja a imagem que importa passar: a Sra. Bhutto estudou em Oxford e em Harvard, era laica e tinha, de facto, apoio popular num país em que as mulheres não são educadas para ocupar postos de topo (ela própria o sabia, quando, pouco antes de concorrer às suas primeiras eleições, se casou à pressa). Contudo, nada disto invalida que tenha sido, por duas vezes, afastada por acusações de corrupção e que, dos seus mandatos de PM, não tenham resultado grandes resultados em matéria de política externa. Ela própria o reconheceu, quando afirmou que detinha o cargo, mas não o poder, que estava nas mãos do exército.

Em segundo lugar, e na sequência desta sua afirmação, temos de reconhecer que o papel de PM no Paquistão não é, em si, garantia nenhuma. A Sra. Bhutto defendia, de facto, posições que em tudo agradavam ao Ocidente, mormente a de uma gradual aproximação à Índia, o que implicava uma diminuição do apoio aos separatistas de Caxemira. Contudo, esta foi também a mulher que, no exílio, forjou um "power-sharing agreement" com o Presidente que, poucas semanas depois, acusou de ser um ditador que não merecia a sua confiança. Argumentarão que, na cena política paquistanesa, a coerência não é o valor mais prezado. Mas não se pode negar que, para o exterior, esse é talvez um dos principais barómetros para se aferir da "adequabilidade" de um candidato.

Dito isto, é evidente que o atentado foi lamentável; que teve e terá consequências profundas na cena política do Paquistão; que o Presidente Musharaf, se já tinha pouca credibilidade interna e externa, agora perdeu definitivamente a que ainda lhe restava; que as eleições de Janeiro serão indubitavelmente influenciadas pelo que aconteceu e que o Ocidente perdeu uma potencial aliada (tenho dúvidas, ainda assim). Penso, contudo, que os riscos propagados de separação do Paquistão são altamente exagerados. Tumultos políticos já o país teve vários e não foi por isso que se fragmentou (excluindo, evidentemente, o caso do Bangladesh, que não é comparável à situação actual). O exército não só não o permitirá, como aqueles que se dizem interessados nisso sabem bem que não teriam qualquer sucesso / apelo / raison d'être caso tal viesse a acontecer.

Em suma, a morte da Sra. Bhutto é apenas mais um triste episódio, que, infelizmente, não penso que venha a ser o último com que o Paquistão nos brindará.

quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

Uma vítima a mais

Um remendo curto, porque estou em desterro e não tenho condições para escrever nada de jeito. Alguns dirão que nunca escrevi nada de jeito, mesmo com todas as condições... Enfim.

Este é dos acontecimentos mais graves de 2007, sem margem para dúvida. O Ocidente quis à viva força que o regime paquistanês se aligeirasse, que Musharraf despisse o uniforme, que o Paquistão reencontrasse alguma normalidade democrática. Eu não digo que esteja errado, mas acho sempre esquisita a imagem de generais a despirem as fardas. Adiante.

A morte da Sra. Bhutto é, em boa medida, a morte de Pervez Musharraf. A ditadura paquistanesa encontrava água para se lavar aos olhos da comunidade internacional, e mesmo internamente, por representar um sistema eficaz de oposição ao extremismo islâmico e por ser um aliado dos Ocidentais no Afeganistão.

Um rotundo fracasso, não vos parece? Eis o Paquistão mergulhado em semi-insurreição, o seu governo desacreditado e cadáveres pelas ruas das cidades. A campanha eleitoral já tinha sido o que foi, e agora isto. Não acredito que haja muita boa vontade em Washington, ou onde quer que seja, para com o General de Islamabad, e imagino que se esteja a preparar uma transmissão de poder tranquilo, que não pareça uma demissão, e um exílio razoável para ele. O substituto? Um outro general, alguém de desconhecido no exterior e de reputação sólida entre as Forças Armadas paquistanesas. Alguém que não desiluda as bases do poder, e isso inclui os EUA.

Tudo isto são adivinhas, mas parecem-me adivinhas razoáveis. Se o Paquistão se afundar na anarquia, ou na insurreição concertada, será o terceiro vizinho do Irão a ir abaixo, sem um governo capaz nem ordem interna razoável. É mau para todos, e especialmente mau para o Ocidente. Não há muitas escolhas para além de apoiar qualquer governo forte no Paquistão, com o consequente descrédito para a nossa própria fé na democracia representativa nos países de tradição islâmica.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Não estou satisfeito com este senhor

Qual Harry Potter, o primeiro-ministro interino da Bélgica, Guy Verhofstad, conseguiu, ao que parece, pôr de acordo flamengos e valões para formar um governo mesmo a sério lá para Março. Quem vai estar à frente? O mesmíssimo Yves Leterme, cantautor de renome e bi-ex-formateur.

Parece que a Bélgica vai sair do anedotário internacional e finalmente ter um governo. Como se isso lhe fizesse muita falta. Mas o Plano Otto para a Bélgica fica por realizar, pelo menos por agora. E nós, aqui, com o PIB per capita mais baixo da Zona Euro, temos menos um motivo mesquinho com que nos contentar na desgraça alheia.

Outros virão, que coisa - a Inglaterra tem um treinador italiano que não fala inglês. Eis um.

terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Não são mil palavras, são mil m3 de palavras


Um verdadeiro ícone da Putinada, esta fotografia, e o artigo que acompanha merece leitura.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Última hora

Isto é importantíssimo, e levou menos tempo do que eu julgava. A seguir com toda a atenção.

EUA, Rússia e Jogo de Soma Zero

Em Política Internacional, o Jogo de Soma Zero é tipicamente exemplificado pelo presente estado em que se encontram as relações bilaterais EUA-Rússia, pelo menos no que diz respeito à pretensão da Administração republicana em montar um sistema anti-míssil na Europa (Polónia e Rep. Checa).

Se em momentos anteriores, a Rússia abriu a porta para uma solução mediada, actualmente a questão chegou a um ponto tal em que, se os EUA insistirem em colocar elementos do Escudo em território polaco e checo, Moscovo insistirá na sua 'neutralização'.

Parece então ser muito simples a análise desta situação. Os ganhos dos EUA são proporcionais às perdas russas e vice-versa... ou será que não?

Para os entusiastas das Relações Internacionais, em especial os que acompanham as relações EUA-Rússia, do actual momento de tensão poderá resultar:


a) Roll back norte-americano;

b) Roll back russo;

c) EUA comunicam avarias no sistema que levam à suspensão do programa;

d)EUA avançam com a instalação do sistema e desafiam o Kremlin a responder;


Num clássico exercício de 'tarologia':

a) improvável, os EUA não recuam;

b) improvável, a Rússia não recua;

c) Muito provável saída airosa. Não é encarada ao nível político como uma derrota, adia qualquer decisão sobre esta matéria para o futuro. Não é dificil de vender esta saída pois ao longo dos anos foram várias as falhas deste tipo (por exemplo, esta), sendo altamente duvidoso que alguma vez seja possível atingir uma fiabilidade do sistema na ordem dos 100%.

d) improvável, seria muito 'dificil de vender' e de colocar em marcha. Para isso o sistema teria de estar numa fase de desenvolvimento muito mais avançada.


Avaliando o momento actual e comparando-o com outros momentos igualmente clássicos:

I. Crise dos mísseis de Cuba - Jogo de Soma Zero, vitoria dos EUA nos media (de influência ocidental e muito politizado durante o período da Guerra-fria), empate técnico no campo das RI's.

II. Crise dos Euromísseis - Jogo de Soma Zero, novo empate técnico.

III. Crise da 'Guerra das Estrelas' - os EUA saem vitoriosos, não por mérito próprio da sua política externa, mas porque a falência do sistema político/económico soviético ditou a queda do regime. Como tal, não houve empate técnico, os EUA ganharam o jogo de Soma Zero, de tal forma que demorou à Rússia 10 anos até voltarem a estar de novo na ribalta do xadrêz internacional.

Será este o momento clássico IV? Se assim fôr, estamos perante a hipotese de assistirmos finalmente a... novo empate técnico.
Independentemente deste nosso exercício de 'tarologia', certo é que com estas declarações, a Rússia jogará sempre a jogada de fracturação da Europa, contando com as ansiedades alemãs, com a impetuosidade francesa, a neutralidade ibérica, a agressividade britânica, o atlantismo das ex-républicas soviéticas (agora sob alçada da PESC e PEV, respectivamente), as cautelas nórdicas e a sempre colorida prestação italiana (talvez uma t-shirt como na 'crise' dos cartoons de Maomé).

E o Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU)? Qualquer que venha a ser a sua reacção, será sempre analisada como um fracasso do sistema dominado por Washington (pelo menos aos olhos dos reformistas adeptos da entrada de mais membros permanentes). Sobre isto, gostaria de ouvir o que dizem as autoridades de Brasília e Nova Deli sobre o assunto. Afinal de contas, devem ter uma opinião a dar, como candidatos a um lugar permanente no CSNU...

E a NATO? Limitar-se-á a reagir em conformidade com o seu novo conceito estratégico e defenderá a instalação do sistema à luz da Guerra contra o Terror e da acção preemptiva contra a ameaça iraniana.

Da ocidental praia lusitana

Só uma curta referência à nova campanha pela imagem do nosso país, aqui no International Herald Tribune e saqueado, sem dó nem piedade mas com muita admiração e respeito, daqui.

Finalmente fala-se a sério de demarcar Portugal dos outros países do Sul da Europa, todos metidos no mesmo saco (Itália, Grécia... Espanha, meu Deus) aos olhos dos Europeus do Norte. Parece que a campanha tenta duas coisas boas: (1) criar uma imagem distintiva de Portugal e (2) colocar-se na perspectiva dos destinatários. É pelo menos um espírito muito acertado, tendo em conta os obstáculos à afirmação de uma imagem própria de Portugal no Mundo e àquilo que se comprova nos contactos com estrangeiros. Sim, fala-se de mar, mas já não nas omnipresentes caravelas e saudades e roupa preta. Nunca é tarde para emendar a mão.
Só um problema em tudo isto, e um problema grave, que é a seguinte luminária atribuída ao Ministro da Economia: "History is the past", como que a dizer "oh pá, isso agora não interessa nada". É uma frase que tem tanto de curta quanto de tacanha, e espero que tenha sido apenas um engano na transcrição.





sábado, 15 de dezembro de 2007

Uma menção ao Tratado de Lisboa, porque compete

Compete-nos, como consertistas deste Mundo, referir aqui, mesmo que à distância de dois dias, referir o Tratado de Lisboa, assinado na capital do nosso país. Pessoalmente, não me vou debruçar sbre o seu conteúdo; isso, aqui neste blogue, aconteceu aquando do Conselho Europeu de Outubro. Não houve alterações entretanto que justifiquem novos comentários.

No entanto, há que comentar a cerimónia e aquilo que Portugal tem revelado saber fazer bem, trazendo lustro às nossas velhas glórias de esmorecido brilho: certames. Nós somos bons a organizar certames. Sejam eles grandes ou pequenos, se há muita gente em movimento e um acontecimento e se é em Portugal, é garantia quase absoluta de que vai correr bem e vai ficar bonito na fotografia. Foi a Expo 98, foi o Porto 2001, foi o Euro 2004, foram as múltiplas reuniões e conferências da Presidência (faltam aqui coisas, ajudem).

Dirão: "ah, mas e o conteúdo, hã? O conteúdo? O que é que Portugal ganha MESMO com organizar estes acontecimentos? Os portugueses vivem melhor graças a tudo isto?"

E eu diria, se me perguntassem isso, que Portugal ganha aquilo que lhe faz falta em política externa, que é notoriedade e projecção, mesmo que passageira; que o dinheiro gasto é bem gasto, mesmo que não contribua, directamente, para melhorar a vida nos bairros da Pasteleira e em Fornos de Algodres, ou sequer em Odivelas. Este brilhozinho que brevemente cintila no nosso país reflecte-se em todos nós. Menos naqueles que são baços de espírito.

E a Dulce Pontes... mal, mal. Se para os portugueses já é complicado, imagine-se para um estrangeiro, que nunca ouviu sequer um fado, quanto mais a actuação da Dulce. Dulce na rádio - sempre; em frente aos gringos - não. Mas sei de fonte bem informada que foi a última escolha. Caramba, no melhor pano cai a nódoa.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Um acordo, para não se falar apenas do Tratado

Hoje quero falar do Acordo Ortográfico, aquele sobre o qual corre muita tinta desde há anos e anos para cá. Acordos ortográficos parece que houve muitos, essencialmente entre Portugal e o Brasil, uma vez que nos países africanos a grafia seguida é, essencialmente, a portuguesa.

O acordo ortográfico, este último de que se fala, levanta, como de costume, celeuma em Portugal, e aqui deixo o último artigo sobre o assunto. No Brasil, suponho que não, pelo motivo de que o Brasil tem mais com que se preocupar e porque é o principal beneficiado em deixar correr o marfim. Em Portugal não gostamos (fora quem quer que tenha negociado o dito) sequer que se fale em acordo ortográfico. E porquê? Porque não queremos passar a escrever como se escreve no Brasil. Não queremos mudar a ortografia de 8% das nossas palavras, não queremos escrever "ator". Só por isso.

A coisa seria menos grave se não representasse, ainda por cima, um prejuízo grave para as editoras portuguesas que teriam de reimprimir os livros destinados a todo o Mundo Lusófono (desculpem, não resisti) para se adequarem ao Acordo, enquanto as editoras brasileiras não. Sabe a esforço desproporcionado e, ainda por cima, inglório. Mais vale não fazer, a sério.

Consola-me a sensação de que, como em todos os anteriores, este acordo vai ser letra morta. Vai valer menos que as folhinhas de papel em que está escrito e garatujado no final. Porque é daquelas leis sem eficácia social. Pode ser aprovada, referendada, promulgada e publicada em todos os trâmites e mais algum. Mas os destinatários não a querem aplicar. Maçada...

E tudo isto é escrito, para mais, com a perfeita noção de que a promoção da Lusofonia é e deve continuar a ser uma das primeiras directrizes da política externa portuguesa; que a nossa luta para fazer do português uma das línguas de trabalho da ONU, e que esse português será certamente o do Brasil, é justa e terá resultados; que é graças ao Brasil que o português é uma das línguas mais faladas no Mundo; que tudo se deve fazer para reforçar o estatuto do português como língua quotidiana e de cultura na América do Sul, na África e, com maior custo, já se sabe, na Europa e na Ásia.

A minha única achega a tudo isto é que empobrecer a Língua, harmonizando-a artificialmente, contra a prática e contra o sentimento de tantos, não contribui para estes objectivos.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Para o Kosovo e em força


Se um homem é capaz de assinar um livro assim, é porque certamente saberá o que fazer do Kosovo.


O dia é hoje, e esperemos que não marque o início de tempos alterosos para a Europa.

domingo, 9 de dezembro de 2007

A Cimeira em imagens

Poupo-vos a milhares de palavras (e não fiquem com esse ar de alívio):

Uma das grandes vitórias da Cimeira UE-África foi conseguir atrair a participação da sociedade civil internacional. Na foto a estrela rock Bono, visivelmente cansado depois de ter estado a vender T-shirts encarnadas da GAP a US$ 500 a oligarcas russos.

Ao lado de Cavaco Silva PR encontra-se:

a) Uma guarda-costa de Quadafi em traje de gala;
b) A Secretária de Estado para o Desenvolvimento Internacional do Reino Unido;
c) A senhora de Alpha Omar Konaré, o Durão da UA, ou
d) A presidente da Libéria, única mulher Chefe de Estado no Continente.

Qui se ressemble se rassamble. Parabéns ao Protocolo do Estado pelo sitting (ou standing, neste caso?) que juntou estes dois próceres africanos, o sudanês e o zimbabueano (zimbabuense? zimbabueta?). Uma fotografia memorável, e melhor ainda se estivessem ambos às portas de um lugar que Dante descreveu admiravelmente. E não é o Paraíso.

"Porreiro, pá!"
"Agora é o Tratado, pá."
"Eh pá, vamos a isso. Achas que o Brown vem?"
"Não sei, pá. Mas se quiser mandar a Secretária de Estado dele também pode."

A tríade está completa


No início da sua Presidência da UE, Portugal assumiu três objectivos principais: 1) concretizar uma parceria estratégica com o Brasil, à imagem das que tinha iniciado, em 2000, com a Índia e com África; 2) conseguir um Acordo sobre um novo Tratado; 3) realizar uma demasiado adiada Cimeira com a União Africana. Foram todos atingidos. Contrariamente ao que os cépticos e os tradicionais Velhos do Restelo poderão dizer, não são vitórias pequenas.

A parceria com o Brasil podia ser tida, inicialmente, como uma questão relativamente pacífica. A importância do Brasil na cena internacional é cada vez mais relevante e a necessidade de o reconhecer como parceiro estratégico da UE (em pé de igualdade com a Rússia, os EUA, a China e a Índia) poderia parecer como evidente. Se o fosse, certamente, já outros os teriam tentado. Por vezes as evidências são tão evidentes que ninguém se lembra delas. Por outro lado, Espanha, por exemplo, teria se calhar preferido incluir nessa parceria estratégica a América do Sul (ou Latina, como alguns preferem).

Sobre o Tratado de Lisboa já escrevi e penso que ninguém põe em causa que, apesar de ter sido a Alemanha (e a Chanceler Merkel, porque nestas coisas as pessoas contam e muito) a dar início ao processo, foi Portugal que o concluiu. É meritório. Apesar de algumas dúvidas que persistem sobre a sua aplicação prática, o acordo sobre o Tratado teve pelo menos o mérito de fazer a Europa abandonar uma crise de confiança que já durava há tempo demais.

Sobre a Cimeira com a UA, aí ninguém pode pôr em causa que foi Portugal que, contra ventos e marés, desenhou o plano, o executou e o conseguiu levar a bom porto. Não foi fácil. Da resistência do Reino Unido, passando pela complicada questão dos convites até aos temas a discutir e aos documentos a assinar, o mérito é de Lisboa. Como já referi anteriormente, penso que o diálogo serve melhor os interesses dos países do que a ostracização, que, não só nada resolve, como acarreta o risco de apenas se exacerbarem e aumentarem ainda mais fossos, tensões e posições. Ontem e hoje muito líderes africanos ouviram o que dificilmente ouviriam nos seus países sobre Direitos Humanos, Democracia e Boa Governação. Os governantes europeus, por seu turno, ter-se-ão apercebido que os tão propalados Acordos de Parceria Económica não são uma receita económica assim tão milagrosa e evidente para os países africanos. Sem Cimeira, duvido que algum dos dois debates acontecesse com tanta clareza e visibilidade pública. Valeu, portanto, e quanto mais não seja, por isso.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Afinal de contas, parece que não!

É absolutamente espantoso o número de vezes que a administração norte-americana se vê confrontada com relatórios internos que contradizem em toda a linha os discursos de Washington sobre a conduta dos estados do 'Eixo do Mal'.

Agora é o US National Intelligence Estimate (NIE) a afirmar que o Irão parou com os trabalhos no seu programa nuclear em 2003...

Pois... parece então que afinal de contas... o tipo lá do Irão... pois... e coiso e tal... não está a produzir uma bomba... Ahhh, certo... hummmmm.....

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Um parto difícil

Demorou bastante tempo, para os padrões habituais, mas da Cimeira UE-China saiu, finalmente, uma Declaração Conjunta, com 16 páginas - como que a justificar o hiato temporal entre a realização da Cimeira (28 de Novembro) e a emissão da Declaração (hoje, 3 de Dezembro). Disponível aqui.

Um dos assuntos que marca a actualidade da região, e que foi alvo de declarações pelo PM Sócrates, é o referendo que o PM de Taiwan pretende organizar sobre o pedido de adesão à ONU (repetidamente recusado pela Organização em tentativas anteriores), substituindo Taipé a República Popular da China (que, recorde-se, apenas entrou na Organização em 1971).

Este referendo, como sublinhou a UE - e bem - em Pequim, é um perigo e uma ameaça à manutenção do statu quo. Para Taiwan é um tiro no pé, que não faz, racionalmente, qualquer sentido a um país a quem convém, a todo o custo, manter esse statu quo, evitar uma escalada nas tensões regionais e evitar, também a todo o custo, que aqueles que com ela trabalham e cooperam tenham de escolher definitivamente um lado. É evidente que, do ponto de vista de política interna, o referendo até pode fazer sentido. Mas, com os custos que este passo terá no plano externo, a bondade da sua execução deixa muito a desejar.

A Cuba de Raúl... é a 'China do Caribe'!

Cuba sonha em ser a 'China' das Caraíbas...


http://www.plazapublica.org/articulo.php?id=589&h=343&w=310&sz=36&hl=pt-PT&start=28&um=1&tbnid=NoPmuYU2Of5t8M:&tbnh=120&tbnw=108&prev=

Cuba quer parcerias que lhe dêem expertise para:

- explorar petróleo em águas profundas, no Golfo do México. A nossa GALP está a ficar uma expert... pode ser interessante...
- em transportes, quer melhorar a qualidade de rodovias e ferrovias. Pode ser que a BRISA esteja interessada...
- em turismo, o objetivo é atrair investimentos que complementem os hotéis, de forma a posicionar Cuba no mercado turístico caribenho. Na lista estão a construção de campos de golfe, marinas e parques temáticos e aquáticos e a descentralização dos hotéis, com o potencial de 30 mil novos quartos. De sua parte, o Estado acelerou os investimentos na restauração das edificações coloniais e está reformando lojas e edifícios no centro histórico, que estão sendo transformados em minishoppings e abrigando escritórios.

O governo diz ter trunfos para virar o jogo.
- Temos a oferecer garantia de dividendos livres de impostos, alíquotas menores de importação (de insumos) para construção e produção em Cuba, meio de transporte (são quatro grandes portos e uma razoável malha ferroviária), mão-de-obra formada e excelente posição geográfica - afirma Anaiza Rodríguez, diretora de Avaliação e Gestão de Projetos de Investimento do Minvec.

Como dizia o nosso Fernando Peça, "E esta hein?!?"

Nem alívio nem democracia

Motivo simples: o Presidente Chávez continua no poder até 2012, e esta derrota no referendo não significa nada. Tal como Putin, pode bem continuar como Grande Líder Nacional, ou Pandita, ou Grande Kahuna, ou o título que lhe quiserem dar. Não é por haver limites à reeleição que os ditadores populistas alimentados a petro-dólares largam as rédeas do poder.

Mais: pode até querer acelerar a Revolução Bolivariana ("perdi o referendo mas continuo Presidente") para deixar tudo pronto, em velocidade de cruzeiro, para quando «sair» em 2012, e aí está a comunidade portuguesa com as suas padarias e supermercados a pedi-las. Atenções redobradas àquilo que tanto Chávez quanto Putin vão fazer nos próximos dois ou três meses.

Como os defensores da «democracia material» tanto gostam de dizer - e com toda a razão - a democracia não se limita, nem se esgota, em eleições. Democratas de campanha conhecemo-los bem: o Prof. Salazar nunca perdeu umas eleições.