segunda-feira, 21 de julho de 2008

De volta aos EUA

Depois de algum tempo sem me referir à campanha presidencial dos EUA, eis que volto ao tema numa altura em que a aura de invencibilidade de Obama se começa a desvanecer. O primeiro sinal de que a sua vitória em Novembro não será um passeio no parque veio das reacções à capa da última "New Yorker", revista liberal (isto é, de esquerda nos EUA) que certamente apoia Obama, mas que se dirige a um público ínfimo, capaz de perceber sátira política, e não à generalidade dos americanos que viram no cartoon de Obama vestido de muçulmano, a celebrar o black power com a sua mulher enquanto uma bandeira dos EUA ardia na fogueira, uma reflexão das suas próprias preocupações em relação ao candidato.

Mais preocupante do que isto, contudo, é a acusação, agora generalizada, de que Obama se vendeu. Traiu o seu eleitorado de esquerda, fiel e entusiasta, que lhe assegurou a vitória nas primárias, e aproxima-se agora do centro político (de que McCain se está a afastar para conquistar o eleitorado de direita que garantiu aos republicanos todas as suas vitórias desde Reagan). Este limar de posições (penso que não se pode falar de flip-flop como alguns comentadores têm dito) é normal em qualquer campanha e a maioria dos norte-americanos não se espanta, por exemplo, quando McCain recua no seu apoio à legislação que possibilitaria a legalização de imigrantes ilegais. Mas quando Obama o faz cai o Carmo e a Trindade. E cai porque a sua campanha sempre assentou numa mensagem de mudança, de não submissão à Washington-politics e de afastamento do sistema. Agora que se vê que ele é um candidato como outro qualquer - que prefere o dinheiro dos privados ao financiamento público, que começa a perceber que retirar todas as tropas do Iraque em 16 meses sem qualquer tipo de concessão é impossível, que apoia a pena de morte, que defende o direito dos americanos usarem armas - os seus apoiantes entuasiastas começam a afastar-se, fazendo a sua campanha ressentir-se, e os novos eleitores desconfiam da sua credibilidade e honestidade.
Nenhum destes sinais é positivo. E as sondagens começam a demonstrá-lo.

segunda-feira, 14 de julho de 2008

Justiça internacional

Já aqui expus a minha opinião sobre os Tribunais Penais Internacionais e os seus méritos na pacificação de sociedades muitas vezes devastadas por décadas de conflitos internos. Como então disse (ver aqui) tenho dúvidas sobre se não serão as Comissões de Reconciliação Nacional, que fizeram o seu caminho em países como a África do Sul, um melhor caminho a seguir.

Surgem estas reflexões a propósito da acusação pelo TPI do actual Presidente do Sudão por crimes de guerra e outras preciosidades. Eu, pessoalmente, não tenho quaisquer dúvidas que o senhor (e isto já é um overstatement) é um facínora da pior espécie. Mas essa não é a principal questão. O que importa agora estabelecer é se essa acusação, com todas as consequências políticas que terá, servirá o propósito, que será também o do TPI, de permitir a reconciliação nacional no Sudão e a efectiva implementação de um processo de paz. Tenho muitas dúvidas de que assim seja, tanto que as Nações Unidas já anunciaram que, temendo as cenas que se seguem, retirarão do país todo "o pessoal não essencial".

Neste mesmo dia, é apresentado aos Presidentes da Indonésia e de Timor-Leste um relatório de uma Comissão conjunta estabelecida para averiguar responsabilidades no período pré e pós-referendo de 1999. A culpa é largamente atribuída ao exército indonésio, mas ambos os Presidentes já vieram a público dizer que não pensam que o objectivo de pacificar a sociedade timorense (e a indonésia, já agora) seja atingido através de acusações criminais. Conhecendo Timor e lembrando-me dos recentes episódios de violência entre timorenses não me espanta que isto possa ser verdade.

segunda-feira, 7 de julho de 2008

Brasil

Uma das consequências políticas mais relatadas da recente libertação de Ingrid Betancourt das mãos das FARC foi a vitória da estratégia brasileira sobre a que tinha vindo a ser seguida pelo regime populista de Chavez. De facto, Lula da Silva não sucumbiu à fácil tentação de apelar a negociações com um grupo terrorista, nunca o seu país financiou aquele grupo nem a elite política brasileira nutria qualquer tipo de admiração expressiva pela "guerrilha marxista" (uma expressão pomposa para quem hoje em dia não se dedica a outra coisa que não o tráfico de droga). Um cenário, portanto, completamente oposto àquele que se vivia, e ainda hoje vive, na Venezuela: Chavez admirava as FARC, compreendia os seus princípios, entendia como forma legítima de os defender o uso da força e apoiava financeira e politicamente os seus dirigentes. Tudo coerente, portanto, com a sua própria ideologia política, mas, et pour cause, altamente lesivo para os interesses da Venezuela, agora subjugados a uma política externa errática, sem rumo e cuja única motivação parece ser a de fazer o que quer que seja que possa ser visto como uma afronta ao "Império".
A este propósito, e sobre a subtil e pacífica ascensão política do Brasil e a muito publicitada queda da Venezuela, leia-se isto.

sexta-feira, 4 de julho de 2008

O primeiro teste de Medvedev

O Ocidente decidiu dar, e bem, uma oportunidade ao novo Presidente russo. As suas prioridades em matéria de política externa não diferem muito das de Putin, pelo contrário, mas a maneira como estas são enunciadas e defendidas é claramente diferente. O estilo é outro e em relações internacionais interessa tanto aquilo que se diz como a forma como se diz.
Hoje o Presidente Medvedev poderá estar perante o seu primeiro grande teste. A Geórgia atacou a Ossétia do Sul, respondendo, alega Tiblissi, a um ataque a um checkpoint (vide aqui) Ora, é conhecido o apoio russo às regiões separatistas da Geórgia, onde mantém supostas forças de manutenção de paz. A reacção da Rússia a estes acontecimentos (depois de ter enviado reforços militares para a Abcázia na sequência da decisão da NATO na Cimeira de Bucareste de admitir ponderar no futuro a adesão da Geórgia à Aliança) determinará certamente se a boa-vontade até aqui demonstrada pelo Ocidente tem razão de ser ou se se vai esfumar dentro de momentos.
Uma situação a acompanhar...