sexta-feira, 28 de março de 2008

Tibete

O que se está a passar no Tibete não é tanto uma surpresa, mas antes uma confirmação do que a China está disposta a fazer, mesmo nas vésperas dos Jogos Olímpicos de Pequim, para manter a unidade da pátria. Taiwan deve tomar nota.

Mas mais do que discorrer sobre as acções dos monges e as represálias do exército, gostaria, aqui, de me referir às hipóteses de boicote dos JO que sistematicamente são referidas, tanto pelos eurodeputados como, até, pela parelha Sarkozy-Kouchner.

A UE deve, sem medos nem hesitações, assumir os seus valores e promover a sua disseminação sem quaisquer receios. Até aí estaremos todos de acordo (penso eu!). Afirmar já que se boicotarão as cerimónias de abertura e encerramento dos Jogos (oportunidade única para a liderança chinesa mostrar a todo o mundo o seu progresso e desenvolvimento) será a melhor maneira de o fazer? A meu ver, não. Felizmente já ninguém se refere a boicotes pelos atletas, que apenas servem para pôr em causa o espírito olímpico (que muito bem pode fazer a populações limitadas nos seus contactos com o exterior). O que está hoje em dia em causa é um boicote político. Humilhar a China não aparecendo. Sinceramente, duvido que funcione. Pequim poderá estar preocupada com a imagem que transmite. A limpeza das ruas, a deslocalização de fábricas, as aulas públicas aos cidadãos com matérias como "fazer uma fila", são sinais disso mesmo. Mas há coisas mais importantes para a China do que a sua imagem internacional. A unidade do país é uma delas. E por isso não há boicote que funcione. Daí que seja preferível manter a pressão, exigir mais diálogo, procurar manter o assunto na agenda, mas não misturar o plano político com o desportivo, isolando Pequim com países pouco recomendáveis, deteriorando as relações com o Ocidente e fechando possíveis portas de entendimento futuro.

terça-feira, 25 de março de 2008

Regresso

Que não se julgue que O Conserto das Nações é gerido e erigido por gente com pouco que fazer, nem muito menos por gente que não tira férias na Páscoa. Dito isto, segue-se uma curtíssima resenha do pouco que se passa por este mundo fora:

1 - China, Tibete, Jogos Olímpicos. Os únicos lugares do mundo onde não há secessões possíveis é nos membros permanentes do Conselho de Segurança. Excepção feita à URSS, por desistência/dissolução da própria, e às velhas potências coloniais Reino Unido e França, porque outros membros do Conselho de Segurança (não digo nomes) assim o decidiram. Estabelecer regras neste mundo, como se vê, não é fácil.

2 - SEXA PR está em Moçambique, falando do Renault Dauphine com que "desbravou África". Uma escolha de palavras a que talvez alguns moçambicanos não terão achado graça, mas que, não obstante, talvez seja desculpável, sabendo quão poderoso é o feitiço do Império. Ninguém é perfeito.




3 - Por fim, uma nota de humor e boa disposição vinda do mais improvável dos lugares, e que é já bem exemplificativa de que sopram ventos diferentes daquela remota parte do mundo. Seja como for, o momento musical que se segue é muitíssimo bonito, e vale a pena:

A Aliança

Regresso, depois de um longo período de ausência, para escrever sobre um assunto que tem, em Portugal, passado um pouco despercebido, mas que é essencial não só para a segurança da zona euro-atlântica, mas também, e consequentemente, para o conjunto das relações da UE com a Rússia. Refiro-me à próxima Cimeira da NATO em Bucareste, em que deverão ser aprovados os Membership Action Plans (antecâmaras de uma futura adesão) da Albânia, da Croácia e, provavelmente, da Macedónia (se a Grécia aceitar um compromisso sobre o nome do país). Preocupante, contudo, é a discussão que terá igualmente lugar sobre as aspirações de adesão da Ucrânia e da Geórgia.
Há Estados-membros da Aliança, com os EUA à cabeça, que apoiam fortemente a adesão de Kiev e de Tiblissi. Do lado de cá do Atlântico, contudo, a perspectiva é um pouco mais comedida e, a meu ver, mais realista.

A NATO é uma aliança de defesa que, com o fim da Guerra-fria, precisou de uns anos para encontrar o seu novo rumo, após o colapso da sua raison d'être (a URSS). Foi um processo complexo, mas a Rússia continua a pairar na cabeça de muitos Estados, principalmente da Europa de Leste, como uma ameaça real. A NATO, hoje em dia, não tem um inimigo claro e identificado, levando a que a célebre máxima que levou à sua criação ("keep the americans in, the germans down and the russians out") tenha perdido muita da sua actualidade. Houve, e continua a haver, claros sinais de uma crise de identidade na Aliança, que, após 1991, liderou, pela primeira vez, uma intervenção armada e está agora envolvida na sua primeira guerra. Durante alguns anos o debate foi sobre as out-of-area operations. Este é um assunto hoje em dia resolvido - as fronteiras são hoje em dia de interesses e estes defendem-se onde for preciso, mesmo que em Cabul.

A putativa adesão da Ucrânia e da Geórgia apenas complica este cenário e demonstra que a crise identitária se mantém. Numa altura em que a postura perante a Rússia deveria ser de unidade, firmeza e coerência, há Estados que ainda acreditam que é necessário manter a Russia out. Para isso é necessário cercá-la de todos os lados e admitir Kiev e Tiblissi no círculo dos Estados amantes da paz e da liberdade. Nada de mais errado. Que eles amem a paz e a liberdade óptimo. Que tenham relações privilegiadas com a Aliança fantástico. Que a ela adiram nem pensar, pelo menos num futuro próximo. A Rússia tem ainda hoje um profundo complexo de menoridade e cercá-la dessa forma apenas o iria exacerbar, com graves custos não só para a Ucrânia e para a Geórgia (as relações comerciais seriam as primeiras a sofrer e muito) mas para o conjunto dos Estados-membros da Aliança, o que, é certo, confirmaria os receios dos Estados da Europa de Leste, quanto ao urso russo. Contudo, evitar a adesão não só adoçaria o urso como lhe demonstraria que a Aliança já não está orientada contra Moscovo e que espera da Rússia uma atitudade cooperante nos mais variados assuntos. E neste plano a dura verdade é que nos temos comportado mal com Moscovo. Por um lado exigimos mais e melhor cooperação. Queremos ser amigos. Por outro espetamos-lhe facadas destas nas costas. É, no mínimo, insensato. E feio.

Por mais que custe a alguns, ainda há Estados que devem funcionar como buffer zones. O conceito, recorde-se, não se aplica apenas a situações em que do outro lado esteja um inimigo. Ele é igualmente válido nos casos em que do outro lado está um país enorme, particularmente sensível e militarmente significativo, que não convém nada atiçar. Mais uma vez a escolha é entre o confronto e a cooperação. Conscientemente, quem, podendo optar pela segunda, escolhe a primeira?

terça-feira, 18 de março de 2008

Irresistível II

Tenho, antes de mais nada, de penitenciar-me: eu não devia estar a usar o digno O Conserto das Nações para isto. Isto, quero dizer, não é completamente alheio a questões de política externa - aliás, é relevante, interessante e até acredito que vá permanecer na memória colectiva durante algum tempo.

Mas por mais voltas que se lhe dê, é lixo. Perdão. Contritamente.

Como no nosso país, pela 1000.ª vez, se adopta um "modelo" (estamos na fase do modelo finlandês), também me parece salutar ver como os nossos irmãos escandinavos não são todos uns anjinhos louros hiper-produtivos e que só vieram ao mundo para nos mostrar todos os dias o quão insuficientes somos todos, mesmo todos.

Pronto. Não repito a gracinha. Mas que tem graça, tem.

quinta-feira, 13 de março de 2008

Sentido de Estado... e de humor!

O blog Notas Verbais não resistiu e nós também não, por isso aqui vai...

Do Correio Brasiliense,

"No Rio de Janeiro para participar da organização das solenidades que marcam os 200 anos da chegada da família real ao Brasil, o embaixador de Portugal, Francisco Seixas Costa, foi abordado por um estudante que lhe fez uma provocação, dizendo que o Brasil seria melhor se tivesse outros colonizadores, como os holandeses. Seixas da Costa não perdeu a fleuma. Depois de sugerir ao jovem que estudasse mais a história do continente, saiu-se com esta: "Queria ver você cantar Garota de Ipanema em holandês!""

Quem fala assim, não é gago!

quarta-feira, 12 de março de 2008

A kind of Magic!

O Ministro dos Negócios Estrangeiros francês, Bernard Kouchner, afirmou numa entrevista que manteve com Roger Cohen, do International Herald Tribune, que os Estados Unidos da América 'perderam a magia' e que o sucessor de George W. Bush dificilmente a conseguirá recuperar. Depois de o afirmar, Kouchner acrescentou que os EUA mantêm o poder militar mas que a imagem externa do país demorará a ser restabelecida.

Este activista da esquerda socialista francesa, Ministro de um governo de centro-direita (onde é que eu já vi isto...?) considera que existe um novo mundo e uma nova diplomacia, mas que o exercício desta 'nova' diplomacia "is very difficult, very time consuming".

Aqui está a razão pela qual é imperativo que qualquer responsável político (e político responsável) que exerça o cargo de MNE, deve ter uma consciencia temporal apurada e uma visão holistica da História. Este senhor, cheio de si (afinal trata-se de um dos fundadores dos Médicos sem Fronteiras) vai dizendo uma barbaridades de quando em vez para arrepio dos mais atentos. Senão vejamos:

- Para um bom analista, expressões como 'a magia acabou' soam a determinismo bacoco. As Relações Internacionais não se fazem de 'magias', fazem-se de trocas comerciais, acordos políticos e diplomáticos, de cooperação internacional a diversos níveis, de relações inter-estaduais e com ONG's, relações bilaterais e multilaterais, onde a personalidade dos líderes políticos assume alguma importância no processo, mas não toda. A política externa norte-americana tem mais de dois 230 anos e não são os 8 anos de actuação da Administração Bush que lhe tiram a 'magia'. Ser superpotência constitui por si só "a kind of Magic" que não se perde sem mais nem menos.

- Para um bom analista, expressões como 'estamos perante um novo mundo' soam a determinismo bacoco. O mundo é o mesmo e o 'homo homini lupus' mantém a mesma actualidade (apenas a 'tecnologia' empregue é nova). Compreendo a afirmação, mas apenas se não considerar os séculos de história mundial que moldaram a actualidade.

- Para um bom analista, expressões como 'nova diplomacia' soam a determinismo bacoco. A Diplomacia não é nova, é velha como a história. Com a evolução das sociedades e dos mecanismos inter-relacionais entretanto criados, a Diplomacia passou a ser exercida em dois métodos: o multilateral (as Nações Unidas são o maior exemplo) e a diplomacia aberta (aquela praticada por Chefes de Estado e de Governo em Cimeiras como as do G8 ou nos Conselhos Europeus). Não acho que se trate de uma 'nova' Diplomacia, para mim é a mesma mas com novos atributos e áreas de intervenção.

Novo Sr. Kouchner, nada, até porque a Diplomacia tem horror a novidades e a surpresas. Compreendo que seja por vezes exasperante e "very time consuming", mas o exercício da Diplomacia está reservado aos mais pacientes, aos mais preserverantes, àqueles que têm uma comprensão do tempo muito diferente do conceito de imediatismo dos nossos dias. Para alguns Estados como Portugal, que já andam nestas andanças da Diplomacia há algum tempo, são séculos de relações diplomáticas que estão em causa e que é preciso considerar e saber manter. It's a kind of Magic!

segunda-feira, 10 de março de 2008

Eleições no Zimbabwe

"O governo zimbabweano, muitas vezes acusado de fraude eleitoral, declarou esta semana que o escrutínio crucial previsto para finais de Março corrente será livre e justo.


Esta promessa foi feita pelo ministro zimbabweano dos Negócios Estrangeiros, Simbarashe Mumbengegwi, aos diplomatas acreditados no Zimbabwe. Nessa ocasião, o chefe da diplomacia zimbabwena afirmou que um intenso trabalho preparatório, que envolveu a oposição, foi feito para assegurar a realização das eleições livres e justas a 29 de Março corrente para eleger um novo Presidente e novos representantes das Câmaras Baixa e Alta do Parlamento. O chefe da diplomacia zimbabweana afirmou que observadores estrangeiros foram convidados para controlar o desenrolamento do escrutínio, mas que os países críticos ao governo foram excluídos. Trata-se, entre outros, da Grã Bretanha e dos Estados Unidos que lançaram uma campanha contra o governo do Presidente Robert Mugabe, acusando-o de violações dos direitos humanos e de fraudes eleitorais", acusões rejeitadas pelo governo zimbabweano.

No passado, os partidos da oposição do Zimbabwe acusaram o governo de ter procedido a uma fraude maciça dos votos, acusações que as autoridades continuam a desmentir. Desta vez, a oposição ameaçou sair às ruas se casos de fraude forem assinalados. "

com http://www.angolapress-angop.ao/africa.asp

Até podia ser verdade...

Curtas IV

- Hugo Chavez é grande! Mas acho que é bipolar.

- Vladimir Putin é ainda maior!

- Nicolas Sarkozy já esteve melhor....

- A Boeing perde para a Airbus (again...), e Portugal esteve lá.

- Os EUA não estão interessados no Uzbequistão, pelo menos a título formal...

- Este senhor pode ser o fim da África do Sul...

- Maggie Thatcher está melhor... mas Sir Francis Pym nem por isso...

sábado, 8 de março de 2008

Paz em Macondo

E acabou-se tudo. Os presidentes deram mãozadas, bacalhaus e palmadões nas costas, e os batalhões blindados bolivarianos já não vão extinguir milhares de espécies desconhecidas na selva colombiana.

Quem ganha, quem perde? Ganha quem não se cobriu de ridículo em frente às câmaras e quem conseguiu alcançar os seus objectivos: a Colômbia.

Perdem os demais, a Venezuela por mais um "Chavismo", perdem o Equador e a Nicarágua por gritarem a todo o mundo que são paus mandados da Venezuela (então a Nicarágua, Deus do céu, que em 24 horas cortou e reatou relações com a Colômbia...), perde finalmente o Brasil pelo papel apagado em todo a situação. Brasília teria ficado bem na fotografia sendo o cenário dos abraços, mas não - foi Santo Domingo. Estas oportunidades não aparecem todos os dias.

quinta-feira, 6 de março de 2008

Biocombustíveis

Pode parecer um tema no mínimo deslocado num blog dedicado a assuntos de política externa. No entanto, basta olharmos para um mapa e para uns quantos indicadores económicos para nos apercebermos do enorme impacto e das possíveis consequências negativas que a recente deriva, senão mesmo obsessão, pelos biocombustíveis pode originar.

O que me preocupa não é o mérito da solução - não sou especialista, nem pretendo ser. Há, de resto, estudos com os mais díspares resultados quanto à eficácia dos biocombustíveis na redução da emissão de gases com efeito de estufa. Olhar para a proveniência desses estudos também é um exercício interessante, mas não é dele que me pretendo ocupar por agora.

O que está em causa são as consequências geopolíticas desta decisão. Não são poucos os autores que defendem que os conflitos no século XXI vão ser em larga medida função da escasez de recursos naturais (como se, até agora, não o tivessem sido igualmente!). Se passarmos de uma economia dependente em larga medida de petróleo para uma assente na transformação em combustível de cereais não vejo porque não estabelecer também aqui uma ligação.

Acresce que há zonas do mundo em que a competição por terra arável é já uma realidade - se à básica necessidade de alimentação de populações acrescentarmos um enorme benefício económico na forma de combustíveis só podemos imaginar o que vai acontecer.

Por outro lado, a água potável é cada vez mais um bem escasso, e igualmente motivo para fortes desavenças e possíveis futuros conflitos (the Middle East comes to mind), pelo que desviá-la para plantações com um maior e provavelmente mais rápido retorno económico não parece uma solução muito inteligente.

Há igualmente que ponderar a ligação há muito estabelecida entre segurança e desenvolvimento. Se considerarmos que hoje não falamos em fronteiras territoriais, mas antes em fronteiras de interesse não é igualmente um exercício muito difícil concluir quais as consequências no primeiro vector (segurança) de uma diminuição do segundo (desenvolvimento), mercê de uma quebra assinalável da oferta de cereais básicos.

Podemos igualmente pensar nas consequências para a economia global que um aumento considerável dos preços dos cereais acarretará. Se as metas propostas pela UE vierem, de facto, a ser plenamente assumidas, as oscilações a que temos assistidos na bolsa de Chicago, por exemplo, terão apenas tendência para se eternizar.

Finalmente há a magna questão ética. Neste ponto (e tal como o Economist apenas neste) concordo com Fidel Castro. Uma solução que aposta aposta no desvio de cereais para a produção de combustíveis, levando, assim, a um aumento do seu preço, quando a fome mundial é o que se sabe, não me parece eticamente muito louvável.

quarta-feira, 5 de março de 2008

Irresistível


Poll: Bullshit Is Most Important Issue For 2008 Voters

Curtas III

#1 - Ohio, Texas, Clinton. "Yes she will"? Maybe, maybe not. Looking good for McCain, though.

#2 - Falando em McCain, o recém-ungido candidato Republicano foi encontrar-se com o chefe do partido à Casa Branca, procurando a bênção de um "conservador genuíno". Se é boa ou má ideia, o tempo o dirá, mas parece um pouco inevitável, a bem da unidade do partido. McCain também merece agora um pouco mais da nossa atenção.

#3 - Com um pouco de atraso, vitória de Zapatero no último debate, Segunda à noite. Rajoy é fraco, não apresentou (no debate) uma única proposta substantiva para Espanha e insiste na niña. Não funciona, mas nem a cacete. Caramba. Eleições Domingo.

#4 - Continua-se a chocalhar espadas na América do Sul. Só ouço declarações ponderadas da Colômbia - se descontarmos a história da bomba nuclear que as FARC quereriam fazer. Isso é quase como os 45 minutos de distância do lançamento de AMD pelo Iraque.

#5 - A nossa animada discussão sobre a boa razão, ou não, da retirada do Iraque merece posts, Niccolò. Pense nisso que eu também.

Não resisto

Estava inspirada, convenhamos...

Ainda não foi desta...

Ainda não foi esta noite que ficou claro quem irá ser o candidato democrata às eleições presidenciais. Do lado republicano, contudo, será McCain, tendo ontem à noite servido apenas para confirmar aquilo que já todos sabíamos...
Tal como o Otto, já estou um pouco farto de escrever sobre as eleições primárias nos EUA, mas não deixa de haver algumas coisas a registar.
A vitória de Clinton no Ohio, no Texas e em Rhode Island (ninguém se lembraria sequer de esperar que este estado lhe desse a vitória) deram azo a um dos melhores discursos de Clinton de sempre. Tal como aquela frase com que terminou o debate no Texas, o discurso de ontem foi inspirado, emotivo, pessoal. Parecia Obama... Este, por seu turno, fez um discurso racional, frio, quase calculista. Podemos ter perdido no geral, mas continuamos a liderar no número de delegados, disse ele. Para um candidato-poeta não foi o seu melhor momento.
O que os resultados de ontem confirmam, mais do que o facto da corrida continuar aberta, é que tudo não passa de psicologia. Os títulos dos jornais passaram de "Hillary has to win Texas and Ohio" para "Major victory for Hillary". A vitória pode não ter sido grande em número de votos, mas foi enorme em termos de imagem pública, permitindo parar o até-agora-imparável Obama. Ah e percebemos outra coisa também: a partir de agora the gloves are off. Clinton atacou, forte e feio, Obama e resultou. O anúncio sobre a crise às 3 da manhã (ver vídeo abaixo) pode ter sido decisivo... Only downhill from now... A questão será saber se Obama sabe lutar com as mesmas armas e se, optando por isso, mantém a aura de candidato fora do sistema.





terça-feira, 4 de março de 2008

Venezuela-Colômbia: Segundo Assalto

O primeiro foi ontem. Regresso ao assunto dos tambores de guerra que soam em Macondo (com a devida vénia ao Gabriel García Márquez, claro).

Como me parece que quaisquer comentários à política externa venezuelana estão cada vez mais votados à insuficiência e ao esgotamento do vocabulário de quem neles se aventura, prefiro deixar aqui as ligações para a imprensa online de cada um dos países envolvidos, para que os nossos leitores (essa legião!) possam ir beber directamente à fonte.

Ora então:

Pela Colômbia: El Espectador, El Tiempo e La República.
Pelo Equador: La Hora, El Comercio e Hoy.
Pela Venezuela: El Nacional, El Universal e El Mundo.
Pelo Brasil (de onde não leio nada de encorajador): A Folha de São Paulo, O Globo e Veja

Uma turbo-reflexão: o facto de a Colômbia ter morto guerrilheiros das FARC em território equatoriano é uma violação da soberania deste último país. Mas o governo de Quito parece dar mais importância a isso do que aos factos de (1) guerrilheiros estrangeiros se encontrarem no seu território e (2) ou conduzirem operações de guerra a partir dele ou, no mínimo, encontrarem nele refúgio.

Não me parece estranho, porque se sabe de que lado se encontram as pessoas; só me parece um rabo escondido com o gato de fora, que só não vê quem não quer.

segunda-feira, 3 de março de 2008

Curtas II

#1 - Que Dimitri Medvedev (para aspirantes a José Rodrigues dos Santos, lê-se Miédeviédiéve, torcendo os lábios da direita para a esquerda) tenha ganho as eleições na Rússia, não é grande notícia, e não merece destaque. Merece sim, na próxima reunião dos G8, por exemplo, que a Chanceler alemã lhe pergunte: "Estás tu de turno, agora?"

#2 - Já merece mais destaque o pé de guerra em que Hugo Chávez pôs o seu país, e que espero não tenha alastrado à Colômbia, país visado pelo chocalhar de sabres bolivarianos. Mesmo assim, é agradável ver como um adversário se desacredita sozinho. Uma oportunidade para a Colômbia se deixar estar e sair bem na fotografia, sem reagir; e uma oportunidade para o Brasil, para flectir músculo na sua remota Amazónia e mostrar que a potência regional ali é ele e não a Venezuela.

#3 - Gastão Salsinha entregou-se às autoridades. Ainda bem. Esperemos que Timor normalize, nem que seja um bocadinho só.

#4 - Sempre a destacar, os cartoons de Peter Brookes no The Times Online. A nunca perder.

Regiões da Europa II

Retomo aqui, depois de uns meses de interregno, a revista das Regiões da Europa, bocadinhos do nosso continente que, por um motivo ou por outro, lutam denodadamente contra o centralismo imperialista, chauvinista e opressor de outro bocadinho do nosso continente.

A homenageada de hoje é a Catalunha, ou melhor, os «Paisos Catalans», um pot pourri que amalgama as comunidades autónomas da Catalunha, Valência, Baleares, uns pozinhos de Aragão e o departamento dos Pirénées-Orientales (vulgo Rossilhão, em França). Se as regiões mencionadas a seguir à Catalunha estão muito interessadas nos PC, isso é outra conversa.
O nacionalismo catalão é um daqueles que, não sendo puramente lírico e épico como o escocês (veja-se o primeiro post desta série, de 18 de Setembro de 2007), não é puramente onzeneiro e mercantil como o da Flandres ou da Padânia. É assim um misto de ambos, mas em que o resultado é mauzinho. E mauzinho porquê?

Porque tudo quanto é simbólico do nacionalismo catalão fala de derrota. São umas vítimas históricas, os catalães e a sua terra. Uns desgraçados, portanto.

A começar pela bandeira, a Senyera (que significa "bandeira", em catalão e se lê senhéra), que, mesmo bonita, tem associada a lenda de que foi um conde de Barcelona, ao morrer em combate, que passou os dedos (4) ensanguentados pelo seu escudo até aí inteiramente dourado. Daí as quatro barras vermelhas sobre fundo amarelo. Mas até aqui tudo bem.

Depois há o dia nacional, a Diada (11 de Setembro), em memória do dia 11 de Setembro de 1714, em que, nos últimos estertores da Guerra da Sucessão Espanhola, as tropas de Filipe V tomaram de assalto as fortificações de Barcelona e fizeram um banho de sangue entre os defensores. Desde então (situação confirmada pelos decretos de Nueva Planta, de 1716) que a Coroa de Aragão, a que pertencia a Catalunha, tinha perdido os seus foros e liberdades. Foi o início da Espanha centralizada e unificada, e o dia nacional catalão assinala a sua derrota derradeira. Inspirador.


O hino, valha-nos isso, é Els Segadors, uma melodia tradicional com um som poderoso, e que fala de mais uma revolta fracassada, a dos camponeses em Junho de 1640, aproveitando a guerra entre França e Espanha.

Aliás, a propósito desta revolta circula a ideia pouco esclarecida de que os castelhanos se viram obrigados a escolher entre reprimir a Catalunha ou afogar a restauração da independência portuguesa, nesse mesmo ano. Nada mais falso: a Catalunha recebeu apoio activo da França, porque era teatro de operações e os catalães chegaram a declarar Luís XIII conde de Barcelona. Entre isso e Portugal, a premência da guerra fez da Catalunha a primeira linha. E a guerra com Portugal durou até 1668, já agora, décadas depois da derrota dos segadores. Pelos vistos, já nesse tempo, os catalães gostavam de estrangeiros para heróis do nacionalismo (e aqui falo do Figo, sim, que cometeu o crime de lesa-catalanidade de ir para o Real).

Enfim, não acho o nacionalismo catalão com muitas pernas para andar. Porque não faz apelo ao passado remoto mas robusto que tem (Jaime I, a expansão pelo Mediterrâneo, os Almogávares, a cultura) mas sim ao passado recente desgraçado que preferem recordar. E aos benditos 18% do PIB espanhol que produzem. Uau.

A bem da pluralidade, aqui fica o texto onde fui sacar a fotografia da bandeira, e o site do Conselho Nacional Catalão, onde se encontram dados sobre um país que não é.

Mudança de intensidade

A eleição de Dmitry Medvedev para a Presidência da Fed. da Rússia representa apenas uma normal mudança de intensidade na política russa.

Se passarmos a traços largos a história das sucessões políticas no cargo de Secretário-geral do PCUS desde a Revolução Bolchevique, temos que a Lenine (de linha branda) sucede Estaline (de linha dura) que é sucedido por Khrushchov (de linha branda) sucendo-lhe Brezhnev (de linha dura), Andropov e Tchernenko (período de gerontocracia) e por fim Gorbachev (de linha branda).

No caso da história das sucessões políticas no cargo de Presidente da Federação da Rússia, temos que a Boris Ieltsin (de linha branda) sucede Vladimir Putin (de linha dura) e agora temos Dmitry Medvedev (de linha branda).

Vamos portanto entrar num período de relativa redução de intensidade na forma como Putin e a Rússia exercem pressão no Sistema Internacional. Podemos igualmente supor que o Delfim quererá descolar-se do Mestre para se afirmar, mas não creio que Putin tenha escolhido Medvedev por este ser um destemido.

Sobre o reconhecimento da Independencia do Kosovo...

Não é por solidariedade com o regime de Madrid, nem por simpatia com a causa que Portugal ainda não reconheceu o Kosovo. Simplesmente não há pressa. Concordo com o que diz o Otto, mas estamos (a meu ver, bem) a ser um pouco neutrais (pelo menos para já) , nesta questão.
A proclamação unilateral de Independencia do Kosovo gera um sério precedente potencialmente destabilizador do vizinho continental espanhol e por isso, é mais pela estabilidade da Península que aguardamos, reflectimos e talvez mais tarde reconheçamos a necessidade de enfim... podermos vir a dizer qualquer coisa sobre o assunto.
Primeiro é preciso ver se o Kosovo funciona como Estado de Direito...

Portugal e o reconhecimento do Kosovo

Se está certo ou errado, se devia ter acontecido ou não, se pudéssemos voltar atrás até 1999 e fazer tudo de forma diferente... isso agora não importa.

Perante o facto consumado, Portugal vai ou não vai reconhecer o Kosovo? E se ainda não o reconheceu, porquê? Do que estará à espera?

O argumento principal que por cá corre é que estamos a ser "solidários com a Espanha". E eu até acredito. Claro que há quem diga logo que Portugal está mas é a reboque da Espanha, e que seguiremos o vento que soprar de Madrid.

Aqui, eu já não acredito. Em primeiro lugar, e por questão de princípio, porque aquele ditado sobre ventos de Espanha está fundado em séculos de estudo aprofundado; em segundo lugar, porque dizer-se solidário com a Espanha é uma boa maneira de protelar tomar partido até que os nossos homens saiam de Mitrovica.

Se já sabemos que quem reconhece o Kosovo se torna um alvo para os sérvios, podemos pelo menos ter a serenidade de deixar que as nossas tropas deixem a zona de perigo antes de nos conformarmos (infelizmente, digo eu) com aquilo que aconteceu. Entretanto, sim sim, somos solidários com a Espanha. Coitada.

domingo, 2 de março de 2008

Curtas

#1 - O príncipe Harry no Afeganistão. Diga-se o que se disser, é de homem. Caladinho, com a colaboração dos jornalistas britânicos, num cenário de combate. Está certo. Não me tinha ocorrido que pudesse ser tudo orquestrado como golpe de propaganda. Tinha o cinismo desligado, o Nuno Rogeiro hoje à tarde não. Não se ganha sempre. E já viram o corte de cabelo do candidato Bogdanov? Nuno Rogeiro e Bogdanov na mesma frase. Não digo mais nada.

#2 - Há quem não esteja satisfeito com os resultados das eleições na Arménia. Há sempre histórias estranhas quando aparecem no mesmo parágrafo eleições e ex-repúblicas soviéticas. E aqui meto os nossos co-EM bálticos, porque lá também lá se passam muitas originalidades no que toca ao tratamento das minorias russas.

#3 - Como já estou a ficar farto de escrever sobre eleições nos EUA, espero que Terça seja O dia. Espero mesmo. E deixar toda a gente descansar até Setembro, quando aquecer tudo de novo.