sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

Comissão (Inter)Nacional de Eleições

É com o que este blog se começa a assemelhar, mas não temos culpa da variedade de actos eleitorais que populam por esse mundo fora. Este domingo é a vez da Rússia. Dia 2 os russos vão às urnas eleger Medvedev (não é assim tão difícil de pronunciar, como poderá parecer por este vídeo:



O exercício de domingo é a prova provada do sistema à la Putin de "democracia soberana". Os potenciais candidatos que poderiam causar algum incómodo ao sistema estabelecido foram afastados por alegadas irregularidades técnicas. Restam três: Zyuganov, líder do Partido Comunista, para manter o folclore presente, e Zhirinovsky, o líder nacionalista, e Bogdanov, que até têm feitos uns favorzitos ao Kremlin.
Não será, pois, surpresa para ninguém que Medvedev ganhará por larga maioria e que se tornará Presidente da Rússia, passando Putin a ocupar o lugar de Primeiro-Ministro.
A imprensa internacional tem retratado Medvedev como um candidato mais liberal e, politicamente, não tão crítico do Ocidente. Até pode ser, mas ideologicamente trata-se de uma "gelatina política", parafraseando Manuel Maria Carrilho. Medvedev fará o que Putin quiser, pelo que são de aguardar muito poucas surpresas. Mas voltarei a este assunto...

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Em Espanha também se vota

E as eleições são já no dia 9 de Março. É claro que são importantes para Portugal: a Espanha é a nossa principal fonte de importações, o principal destino das exportações, um mercado cujos altos e baixos se repercutem necessariamente aqui ao lado. Um país com importância significativa na Europa e com quem Portugal tem uma relação... que desafia o vocabulário em muitos planos.

A escolha em Espanha não é particularmente inspiradora: ou o actual primeiro-ministro Zapatero, ou o líder do PP, Mariano Rajoy. O que um é e o outro deixa de ser, importa-me substancialmente pouco. Nada, mesmo. Quero é saber qual deles convém mais a Portugal.

E aqui, é quase inevitável dizer que desta vez é Zapatero. Por dois motivos, um de fundo e outro conjuntural.

O conjuntural é que os últimos 4 anos têm corrido para bem para Portugal, no quadro das relações luso-espanholas. A colaboração nas instâncias comunitárias tem tido resultados positivos para ambos os países, o comércio transfronteiriço incrementa-se, não há os clamores de obstáculos à entrada de empresas portuguesas em Espanha (o que não significa que não existam) e ainda há poucos dias a Convenção de Albufeira, sobre a administração conjunta das bacias hidrográficas dos rios internacionais, foi emendada com resultados favoráveis para Portugal. Este governo do PSOE não é mau para Portugal. Pode continuar.
O de fundo é que o PP não é grande amigo de Portugal. Não é que tenham por bandeira vir por aí abaixo, quais Filipes, tomar conta do nosso cantinho. Não se trata disso. É que o PP tem posto em prática (ou pelo menos foi JM Aznar quem pôs, in illo tempore) o pior dos sentimentos espanhóis em relação a Portugal - a subalternização. Era a questão dos transvases, que Rajoy diz que também fará; as negociações matreiras em Nice (leia-se, por todos, Diplomacia Europeia, do Embaixador F. Seixas da Costa); o mal-parido Secretariado Permanente das Cimeiras Ibero-Americano em Madrid; os obstáculos mal encapotados ao crescimento da EDP, entre outras, em Espanha.

Ou seja, nos tempos do PP no poder, as coisas não corriam tão bem, nem há razão para acreditar que venham a correr melhor. Ler as memórias do ex-PM Aznar esclarecem isso. Dir-me-ão "e o comportamento de Portugal, foi o melhor?" Eu diria que não, e que ultimamente tem melhorado. Mas O Conserto das Nações dedica-se a olhar primeiro para o exterior, ou que espécie de blogue sobre política externa seria este se assim não fosse?

Regresso ao passado

Para os que acreditam que o colapso da URSS e o fim do conflito bipolar significaram o fim da História, os últimos anos têm-se certamente encarregado de os desmentir. Mas hoje, no dia em que o PM checo está em Washington a discutir a instalação de parte do sistema anti-míssil que os EUA querem instalar na Europa para protecção contra os rogue states (eles lêem quase só Irão, eu, não sei porquê, também entrevejo a Rússia), os conceitos áureos da Guerra-fria (GF) voltaram-me à cabeça: corrida de armamentos e dilema de segurança, nomeadamente, eram conceitos que, apesar de não totalmente erradicados do sistema internacional (que não se resume à Europa e aos EUA, recorde-se), eram encarados como anacrónicos se aplicados ao mundo dito Ocidental. Contudo, a crescente assertividade (adoro esta palavra!) da Rússia, as crescentes ameaças do Irão, a absoluta necessidade dos países do Leste Europeu se sentirem a salvo da cobiça de Moscovo, a proeminência dos neo-cons em Washington, entre muitos outros factores, contribuíram para que assistemos, hoje, ao que os nossos pais e avós assistiram durante a GF (e para que isto assim seja não é necessário que os dois lados encarem o problema desta maneira. Se há algo que o dilema de segurança nos ensina é que a percepção de um é suficiente para determinar o comportamento do outro. E um dos lados, sabemo-lo bem, ainda é muito influenciado por estruturas mentais típicas da GF).
Não é definitivamente o fim da História.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

E o homem desgraçou-se

Bem haja a campanha de alguém que desmascarou o Obama aos olhos dos eleitores americanos - e do Mundo! - como um homem malévolo e indigno de confiança e assim mau mau mau mau porque... usou um turbante.

Se fossem só as faixas no peito, vá. Podia estar a participar numa reconstituição das batalhas napoleónicas. Mas não. Tinha de ter o turbante.

Lá vai ele ter de começar um discurso a comer um cachorro quente, ou a mordiscar a boa sandes de courato.

A impressão que me dá é que isto, tal como as notícias sobre a implicação num negócio de uns metros quadrados de terreno, é mesmo o que se rapou no tacho para poder atirar, à falta de melhor.

Mas porquê? Não há mais? Talvez falte mesmo "experiência" ao candidato Obama...

domingo, 24 de fevereiro de 2008

A elegância de um Presidente

De Sarkozy já quase tudo se disse... Que é irascível, emotivo, não muito bem formado, invejoso, sedento de protagonismo e de reconhecimento. Daí a beleza deste vídeo, divulado pelo Parisien e que está a mostrar à França que ainda tinha dúvidas sobre a personalidade do seu Presidente o tipo de pessoa que este verdadeiramente é...

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

E começou

Esta história do New York Times (aqui) confirma duas coisas: 1) McCain é já tido como o candidato republicano às eleições de Novembro (como se dúvidas houvesse); 2) as tradicionais histórias que costumam surgir nestas alturas vão continuar por aí, distraindo os candidatos e os eleitores - mas provando, igualmente, que um rigoroso exercício de escrutínio dos candidatos é parte indissociável de uma campanha política verdadeiramente democrática.

Imaginando

E se as primárias democratas seguissem a regra da maioria das primárias republicanas, i.e., o vencedor em número absoluto de votos recebe todos os delegados do Estado em causa?

A situação actual da distribuição de delegados ("sem chumbo" e "super", por assim dizer) é esta:

Obama - 1319
Clinton - 1250
(Contas da CNN)

Se atribuíssemos todos os delegados de cada Estado ao candidato que obteve maior número de votos teríamos:

Obama - 1213
Clinton - 1192

Conclusões? Que os eleitores democratas, até agora, não têm conseguido decidir-se claramente, com certeza. Que se os Democratas tivessem as mesmas regras que os Republicanos, a corrida estaria na mesma, ou talvez não, por causa dos efeitos psicológicos dos números a acumular-se (hoje correm a favor de Obama, no rescaldo da Super-Terça seria um tsunami para Hillary).

Conclusão segura? Não importa só receber os votos, importa a maneira como esses votos se materializam em termos práticos, consoante o sistema. Com o winner takes all, o Texas, o Ohio e a Pensilvânia poderiam decidir tudo. Assim, talvez não.

Fazemos por isso, mas...

... O Conserto das Nações não é a dádiva de Deus à blogosfera nacional. E por isso:

Era mesmo deste exemplo que estávamos a precisar - Francisco Mendes da Silva, 31 da Armada

Yes, we can! - Ezequiel, 5 dias

Persepolis - Daniel Oliveira, Arrastão

Os Estados viáveis - Tiago Barbosa Ribeiro, Kontratempos

Noite alucinante entre alucinados - Miguel Castelo Branco, Combustões

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Paquistão

São já conhecidos os resultados das eleições no Paquistão e há três factos que importa registar: 1) não houve registos de fraude generalizada; 2) a participação dos eleitores foi muito significativa; 3) os partidos islamistas perderam muita da sua anterior influência. Nada disto significa que o Paquistão seja, ou venha a ser no futuro próximo, uma democracia consolidada. Contudo, estes três sinais desmentem claramente os profetas da desgraça, para quem o sistema democrático é ou deve ser um exclusivo dos "iluminados" países ocidentais e para quem os partidos islamistas devem ser banidos de concorrer a eleições, sob pena de ganharem. Nada, como se vê, de mais errado. Em suma, há sinais de esperança.

Um proverbial sentido de humor

Na Madeira, arquipélago que conheço razoavelmente bem, disfruta-se de um sentido de humor muito especial e que normalmente se materializa em partidas. Os madeirenses são muito amigos disso, o que é que se há-de fazer?

Pois parece que a Assembleia Legislativa Regional da Madeira, um órgão, ele mesmo, que deve muito a um sentido de humor desenvolvido e vibrante para continuar a existir, aprovou um voto de congratulação pela independência do Kosovo. Do próprio texto do voto, resulta claramente que é uma partida - pois não se utiliza exactamente o vocabulário típico das supostas guerras RAM-Continente: ..."para além da situação de contiguidade territorial não impedir a legitimidade da independência do Kosovo, de facto, aí, como noutros locais, verifica-se a imposição de fora do território, de um estatuto político que a população kosovar rejeitava."?

Palavras-chave aqui: contiguidade territorial, imposição, estatuto político. É o transplantar do vocabulário da relação Governo da República / Regiões Autónomas do plano comezinho dos escassos quilómetros entre Lisboa e o Funchal para a política internacional.

O comentário a fazer, como sempre que há destes faits divers, é o mesmo, e dirige-se não aos madeirenses, mas aos demais portugueses: não há madeirense que queira a independência da Madeira.

Não há. O Jaime Ramos não conta.

Este género de declarações é feito somente com propósitos de política interna nacional e regional, porque resulta. E resulta porque em Lisboa governa a geração que assistiu à catadupa de independências nos anos 70, e que guardou, por isso, traumas e fantasmas. E que, no fundo, gosta de se sentir ameaçada por uma região de 300.000 almas com sentido de humor. São guerras de alecrim e manjerona, não são coisas a sério. Não há madeirenses convencidos disso, há sim que desconvencer os continentais (e os açoreanos, se calhar).

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Mais que mil posts...

... isto representa o que eu penso da independência do Kosovo.

E esta minha escolha, posso gabar-me, até é um bocado abrangente, agora que penso nisso (tinha imaginado o post essencialmente como uma exploração muito pessoal das nuances que há na palavra «nojo»):

- está envolto num ambiente de bizarria;

- nada de bom pode daqui vir;

- é perturbante e impossível de ignorar;

- muitas pessoas razoáveis e inteligentes sentem-se repugnadas pelo ocorrido;

- mas constitui certamente um direito, e é praticamente inevitável.

Para que conste, eu nao poluo só este blogue. Já tive aqui belos momentos, como na assinatura do Tratado de Lisboa. Registem lá isso.

Mais um Estado

O Kosovo declarou unilateralmente a sua independência no domingo. Para muitos foi o fim de um processo inevitável que começou em 1999, enquanto, para outros, foi o início de um outro, bastante mais imprevisível, e com ramificações que se podem estender a vários países da Europa.
Pessoalmente, tenho mixed feelings sobre tudo isto. Concordo que era inevitável acontecer o que aconteceu. Mas tenho dúvidas sobre se, em 1999, as coisas tinham de ter acontecido como aconteceram. Por outro lado, a legalidade internacional da Declaração Unilateral de Independência (DUI) e do seu posterior reconhecimento por alguns Estados é, no mínimo, duvidosa. Não me parece, contudo, que seja por aqui que a porca torce o rabo, já que o Direito Internacional é uma área muito nebulosa, que vai evoluindo à medida das necessidades. E a UE, note-se, conseguiu inventar/desenvolver justificações jurídicas para a mobilização da missão EULEX à luz de preceitos de Direito Internacional. Há, por fim, a questão do precedente. Se, por um lado, as circunstâncias que levaram ao domingo passado são, de facto, únicas (intervenção da NATO e criação de um protectorado da ONU), por outro, não deixa de se tratar de um território que unilateralmente declara a sua independência, sem aval do CSONU, nem acordo do Estado de que se separa.

O mais assustador é, portanto, o day after. O Kosovo tem todos os ingredientes para ser um Estado falhado e evitá-lo vai exigir muitos recursos europeus (os EUA não devem dar para esse peditório). Por outro lado, algumas regiões devem procurar maximizar com este precedente (sui generis, como disse Solana, mas, ainda assim, um precedente, diga-se o que se disser) e, assim, aumentar a instabilidade em zonas já em si instáveis. Finalmente, a UE conseguiu alienar a Sérvia, levá-la em braços para a esfera de influência russa e, assim, entrar num exercício longo e penoso, ao longo do qual terá, forçosamente, de conseguir manter o equilíbrio precário nos Balcãs.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Independencia do Kosovo foi melhor do que concerto de 50 Cent!

Lembro-me das aulas do 1º ano do curso de Relações Internacionais, onde à pergunta "Defina Estado?", saltava imediatamente a resposta "Para haver Estado tem de existir em simultâneo um Povo, um Território para esse Povo e Poder Político para governar esse território." É simples. Um Estado soberano é sintetizado pela máxima "Um governo, um povo, um território". O Estado é responsável pela organização e pelo controle social, pois detém, segundo Max Weber, o monopólio legítimo do uso da força (coerção, especialmente a legal).

Ontem, com a declaração unilateral de Independência do Kosovo, percebi que o Estado de Max Weber morreu. Nasceu um novo tipo de Estado. No Kosovo, o Povo é Albanês (que já têm um estado, ali, mesmo ao pé...), o território 'era' sérvio (ficaram sem uma parcela de território histórico), e o poder político é protegido pelas forças da ONU no terrreno (que já disseram que não tencionam sair de lá).

Três vivas para o Kosovo! Três vivas para Bush! Três vivas para a Albânia!

Três aspirinas para a Europa, porque agora vêm aí as dores de cabeça!

Já agora, diz Herzi Abdullahn, de 19 anos e que estuda na Escola Americana, que "Isto é melhor do que o concerto do 50 Cent, que esteve cá!"

... acredito!

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Há coisas que nunca mudam

A China é muitas vezes apresentada como a próxima super-potência, a razão pela qual o Ocidente perderá a sua força e a Ásia emergirá como o novo pólo geopolítico do século XXI. Não sei se será assim, mas sei que estes processos, quando acontecem, não são bonitos e que se baseiam em atitudes menos dignas de todos os intervenientes. Esta notícia apenas nos relembra de uma das pontas do icebergue.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

De volta aos EUA

Os resultados das primárias democratas e republicanas deste fim-de-semana demonstram três coisas: Obama está-se a impor, de forma cada vez mais evidente; Hillary precisa, desesperadamente, de qualquer coisa que restitua à sua campanha uma aura de vencedora (a vitória no Texas em Março poderá já ser tarde); e McCain, apesar de vir a ser o nomeado, não é bem aceite por todos os Republicanos, como demonstram as vitórias de Huckabee.

O que é que tudo isto pode, eventualmente, significar? A meu ver, McCain é uma ameaça séria para os democratas. Não só porque é um candidato naturalmente forte, capaz de motivar as pessoas, mas porque já se sabe que é ele. E isto poderá fazer toda a diferença. Enquanto os democratas continuam envolvidos numa luta interna, de contagem diária de delegados, os republicanos já sabem quem vão apresentar em Novembro. E neste período de tempo em que ainda não tem um opositor claro, McCain esforçar-se-á por convencer os republicanos mais reticentes em apoiá-lo, fazendo discursos mais à direita e recordando o seu passado como priosioneiro de guerra.

Quanto aos democratas, não me parece que se possa já dizer, nesta fase, quem vai conquistar a nomeação, até porque muitos dos "superdelegados" (e são mesmo muitos!) ainda não definiram a sua posição. E tudo indica que será precisamente na Convenção que tudo se vai decidir. Dito isto, Obama parece ser cada vez mais uma opção realista - o que não significa que ganhe no dia das eleições. Os negros não são a maior minoria dos EUA, mas sim os hispânicos (e estes não votam Obama!). Por outro lado, a valorização de uma mensagem de mudança pode perder o seu apelo no verdadeiro dia de decisão - quando a crise económica pode já ter surtido significativos efeitos. Por tudo isto, muitos democratas sonham com um Hillary-Obama ticket ou mesmo com uma dupla Obama-Clinton. Se o primeiro cenário me parece improvável (Hillary não poderia ofuscar o Vice-Presidente como normalmente os Presidentes fazem e não estaria, certamente, disposta a dar-lhe o protagonismo que dele seria exigido), o segundo afigura-se-me impossível (Clinton está a concorrer para ganhar e não para passar mais 8 anos na Casa Branca a fazer o que o Presidente quer - e, note-se, um Presidente em que ela não tem tanta influência).

Em suma, ainda está tudo muito indefinido. Mas uma coisa é certa: aqueles que acreditavam que esta campanha seria apenas mais uma em que dinheiro e boa organização decidiriam tudo, podem-se desenganar.

domingo, 10 de fevereiro de 2008

Turquia

Antes de mais uma declaração de interesses: para mim a União Europeia, mais do que um projecto geopolítico, que o é, é acima de tudo uma comunidade de valores. Só assim se explica a evolução do projecto europeu e o caminho extraordinário que este percorreu desde o final da Segunda Guerra-mundial aos dias de hoje. Neste contexto, se geopoliticamente a adesão da Turquia à UE é um no-brainer (sendo evidente que deve entrar), no plano cultural a questão complica-se. Não pelo factor religioso (a Grécia é ortodoxa e, acreditem, as diferenças fazem-se sentir) ou pelo critério do respeito pelos Direitos Humanos (há EM's na UE a que, se fossem aplicados os restritivos critérios que são aplicados a Ankara, ainda estariam à espera de entrar). É, acima de tudo, uma questão identitária. E neste ponto em concreto é que reside o busilís da questão.
A religião, na Europa, é uma questão há muito arrumada, sendo encarada como reserva da vida privada de cada um, que em nada deve influir na vida pública. Não é líquido que, no quadro euro-atlântico, por exemplo, esta seja uma matriz absoluta - basta olharmos para os EUA! Mas Washington não quer entrar na UE e a Turquia quer. E se quiser, deve (não tem, até porque, em França, há quem não pense desta maneira, como se recordarão) permitir o uso do véu a todas as mulheres, quando e onde estas o desejarem.
Sinal de que a Turquia não é, ainda, "um dos nossos", é, portanto, o debate que opôs, nestes últimos dias, os defensores do véu (associados, erroneamente, a uma corrente islamizadora da sociedade) e os que acreditam que a proibição até ontem em vigor se justificava. Não é por se usar um véu em público que a sharia se aplica. E não é, certamente, pela proibição que se respeitam os direitos individuais dos cidadãos. Sabendo, por outro lado, que o ban travou muitas candidaturas a universidades, não será de pensar que a sua abolição até contribuirá para uma melhor integração das mulheres na sociedade?

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Um história triste

Esta história do Kosovo e da sua independência a prazo e cada vez mais iminente é tristíssima e à medida que o tempo passa só se aprofunda o abismo de que aproximam todas as personagens deste drama.
A UE julgou poder usar para com a Sérvia da estratégia da vara e da cenoura. A cenoura seria a adesão à UE, a vara a exclusão ou a demora indefinida na adesão. Não incluo aqui os bombardeamentos, porque não quero deixar o tom deste post resvalar para o burlesco.

O preço: o Kosovo. As imagens da guerra da Bósnia, a derrota de 1999, o ridículo de Milosevic, a pressão dos EUA, o facto consumado perante o qual a UE abre os braços e diz "Há alternativa?": eis os motivos de termos muito em breve mais um país do tamanho do distrito de Braga na Europa.
Julgo que tínhamos alternativa - nós, Portugal, pelo menos. Apoiámos a independência de Timor, e há muito no Timor independente de que não nos orgulhamos; mas havia boas razões para acreditar (ainda hoje há, aliás) que aquele pequeno Estado, fruto da descolonização interrompida pela invasão e anexação por uma ditadura genocida, tornar-se-ia em algo melhor do que o país de que se separava. No Kosovo não há fé nenhuma num resultado risonho. Os próprios libertadores da região, pouco tempo depois da boa acção, estavam a braços com as descobertas sobre as actividades da quadrilha que era, e é, o UÇK. Os futuros dirigentes de um Estado-falhado no coração da Europa.
Com isto consegue-se alienar e lançar nos braços da Rússia uma nação milenar, com um espírito nacional forjado no sangue e na guerra, com uma história de ânsia de pertença à Europa sempre frustrada por potências estrangeiras. Ganhamos muito em troca, está visto.
A prova provada de que a queda do Império Bizantino às mãos não só dos Turcos como também de Venezianos e Ocidentais em geral merece estar no pódio das tragédias sofridas pela Europa.

Mais um teste

Quem quer divertir-se e fazer um teste político mais bem feito (embora haja sempre que duvidar destas coisas...) que vá a http://www.electoralcompass.com/ e se entretenha.

Eu, posso afirmá-lo que certo orgulho, já não sou dado como apoiante do Dennis Kucinich. Vá. Sou apoiante do Obama. Ha.

Não escrevo mais sobre as primárias até à próxima semana.

Europa das elites?

Uma das mais propagadas "verdades absolutas" sobre a União Europeia é a de que esta é construída de forma "top-down", ou seja, sem que os cidadãos sejam auscultados, nem as suas preocupações ouvidas. Tenho sérias dúvidas, pelos mais variados motivos, sobre a bondade desta visão. Mas mais do que discorrer sobre eles proponho uma visita a este site, verdadeira prova de que os cidadãos estão atentos e de que não são precisos referendos para que as pessoas reflictam, assumam uma posição e a defendam.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Farewell


O Sebastião disse, e disse bem, que andamos a dedicar-nos muito às primárias nos EUA. Tem toda a razão. Por isso, prometo que este é o último post que escrevo sobre as primárias até amanhã. Espero conseguir cumprir a promessa.

Esta é uma das fotografias de que as primárias precisavam. Mitt Romney primou, ao longo da campanha - e há quem diga que ao longo da sua carreira política - por ser a encarnação do troca-tintismo e dos golpes de rins no que toca a projectos políticos e às convicções. Ouvir os seus discursos era experimentar a gravidade zero. Agora vai poder poupar alguns milhões da sua fortuna pessoal e deixa o caminho mais livre para John McCain. Certo - e Huckabee? Alegria nas hostes? Abre-se a porta a um "running ticket" McCain-Huckabee?

Mais sobre o assunto em breve.

Kosovo

Temo-nos concentrado, nas últimas semanas, nas eleições primárias nos EUA, enquanto, noutros lados do mundo, muitas outras coisas acontecem ou estão à beira de acontecer. Fevereiro promete, ser, de facto, um mês muito interessante, principalmente na Europa. O Kosovo deve, numa questão de dias, declarar a sua independência. A Sérvia, antecipando essa declaração, e numa última tentativa de a evitar, recusou-se a assinar um Acordo interino com a UE, que lhe daria, nomeadamente, preferências comerciais (e pouco mais, já que a Holanda se recusou a oferecer a Belgrado um Acordo full-fledged). A Rússia, entretanto, mantém a pressão nas NU, chamando a atenção para a suposta ilegalidade da missão que a UE pretende mobilizar para o Kosovo e alertando o SG Ban Ki-Moon para que não dê o seu apoio a essa missão. Tudo isto depois da imprensa eslovena ter divulgado um relato de um encontro de Dezembro passado entre o Director Político do MNE da Eslovénia e os seus interlocutores nos EUA, em que a futura Presidência da UE e um dos mais fortes apoiantes da independência kosovar decidiam sobre a estratégia a seguir quando Pristina se declarar livre de Belgrado.
Em suma, vamos estar atentos, até porque este é um dos mais sérios testes à unidade europeia e se é certo que alguns Estados-membros não vão reconhecer a independência (a Roménia e o Chipre já o disseram abertamente), é importante perceber se essa posição vai obstar a que a União se envolva seriamente na região, evitando uma escalada perigosa das tensões.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Rescaldo

No rescaldo da longa noite de votação, e para colocar as coisas em perspectiva através da crueza dos factos:

http://edition.cnn.com/ELECTION/2008/primaries/results/scorecard/#D

Uma análise aprofundada seguirá oportunamente as vias oficiais.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

Já valeu a pena

Este é o meu apelo ao voto, antes da Mega-Terça:


Já valeu a pena. Disto, a Hillary não tem. Ha!