domingo, 10 de fevereiro de 2008

Turquia

Antes de mais uma declaração de interesses: para mim a União Europeia, mais do que um projecto geopolítico, que o é, é acima de tudo uma comunidade de valores. Só assim se explica a evolução do projecto europeu e o caminho extraordinário que este percorreu desde o final da Segunda Guerra-mundial aos dias de hoje. Neste contexto, se geopoliticamente a adesão da Turquia à UE é um no-brainer (sendo evidente que deve entrar), no plano cultural a questão complica-se. Não pelo factor religioso (a Grécia é ortodoxa e, acreditem, as diferenças fazem-se sentir) ou pelo critério do respeito pelos Direitos Humanos (há EM's na UE a que, se fossem aplicados os restritivos critérios que são aplicados a Ankara, ainda estariam à espera de entrar). É, acima de tudo, uma questão identitária. E neste ponto em concreto é que reside o busilís da questão.
A religião, na Europa, é uma questão há muito arrumada, sendo encarada como reserva da vida privada de cada um, que em nada deve influir na vida pública. Não é líquido que, no quadro euro-atlântico, por exemplo, esta seja uma matriz absoluta - basta olharmos para os EUA! Mas Washington não quer entrar na UE e a Turquia quer. E se quiser, deve (não tem, até porque, em França, há quem não pense desta maneira, como se recordarão) permitir o uso do véu a todas as mulheres, quando e onde estas o desejarem.
Sinal de que a Turquia não é, ainda, "um dos nossos", é, portanto, o debate que opôs, nestes últimos dias, os defensores do véu (associados, erroneamente, a uma corrente islamizadora da sociedade) e os que acreditam que a proibição até ontem em vigor se justificava. Não é por se usar um véu em público que a sharia se aplica. E não é, certamente, pela proibição que se respeitam os direitos individuais dos cidadãos. Sabendo, por outro lado, que o ban travou muitas candidaturas a universidades, não será de pensar que a sua abolição até contribuirá para uma melhor integração das mulheres na sociedade?

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