domingo, 4 de novembro de 2007

A excepção cultural francesa

Todos sabemos o quanto a França é especial. Os franceses são os primeiros a sabê-lo, e às vezes até parece que têm medo que nós, os demais europeus, nos possamos esquecer disso. Mas como fazê-lo, meu Deus, depois de quase todos termos sido abrasados pela paixão revolucionária de Robespierres e Dantons, libertados pelos exércitos napoleónicos, e defendidos contra a avalanche nazi por Pétains e Lavals? Isso é inesquecível.

A França não é um país detestável, povoado por gente do pior que há. Pode haver quem pense isso, mas não eu. Em França há coisas absolutamente maravilhosas, quem sabe a principal sendo a língua francesa. O problema com a França é que quem a governa perde a sua credibilidade com demasiada facilidade, mas continua a agir como se nada se passasse. E nós, os que achamos que a França é demasiado importante para a Europa e para o Mundo para se comportar desta forma, deixamos passar. Não pode ser. A França precisa de tough love. Perdão, amour inflexible.

A França do Presidente Sarkozy tem-nos presenteado, neste últimos seis meses, com activismo, liderança, protagonismo, hiper-actividade, "o regresso à política pura", disse-se. Pois sim, talvez. Este seu governo age baseando-se numa ideia de França que é belíssima: ideais universais, uma visão alternativa (julgo que mais simpática e socializante) do capitalismo anglo-saxão e, claro, la gloire. É uma boa base emocional e intelectual para apresentar ao mundo como distintiva da França e ao mesmo tempo como base de uma política externa. E apesar de tudo, aconteceram, e acontecerão, coisas destas:


Nunca mais me esqueci desta nota de rodapé nos jornais. Países mais importantes estavam a atacar e a ser atacados e mereciam bem mais a nossa atenção e o nosso apoio ou repúdio, conforme. Rebentar com a Força Aérea de uma ex-colónia no coração das trevas não conta. Este fenómeno, que cabe mais no rol das opere buffe (em português é cacofónico) do que nas páginas da História, descredibiliza a França - pelo menos é a única conclusão que eu retiro destes episódios e de quem os ordena, na época em que os ordena.

Ocorreu-me tudo isto quando soube que o presidente Sarkozy vai a N'Djamena - sem Cécilia, atenção - negociar a libertação dos europeus implicados no caso "Arca de Zoé", algo de tão tamanhamente sórdido que nem eu me disponho a explorar. Fica aqui a ligação para a notícia mais próxima da fonte: http://www.lemonde.fr/web/article/0,1-0@2-3224,36-974348@51-963882,0.html. Desejo-lhe sorte, e não me surpreende que os franceses tenham do sistema jurídico do Chade a imagem que os ingleses têm do sistema jurídico português. Mas é ou não verdade que o episódio das enfermeiras búlgaras também abalou a credibilidade (pela manha rasteirinha, e ainda por cima bem planeada de antemão para a publicidade) do presidente Sarko?

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