domingo, 30 de dezembro de 2007
Ainda o Paquistão
Em primeiro lugar, assistimos, com o seu assassinato, a um fenómeno sempre muito curioso e recorrente: de pessoa por muitos criticada, a Sra. Bhutto é, desde que morreu, a possível-melhor-coisa-que-poderia-eventualmente-ter-acontecido-ao-Paquistão. É extraordinário. Para o Ocidente, e os EUA em particular, percebe-se que esta seja a imagem que importa passar: a Sra. Bhutto estudou em Oxford e em Harvard, era laica e tinha, de facto, apoio popular num país em que as mulheres não são educadas para ocupar postos de topo (ela própria o sabia, quando, pouco antes de concorrer às suas primeiras eleições, se casou à pressa). Contudo, nada disto invalida que tenha sido, por duas vezes, afastada por acusações de corrupção e que, dos seus mandatos de PM, não tenham resultado grandes resultados em matéria de política externa. Ela própria o reconheceu, quando afirmou que detinha o cargo, mas não o poder, que estava nas mãos do exército.
Em segundo lugar, e na sequência desta sua afirmação, temos de reconhecer que o papel de PM no Paquistão não é, em si, garantia nenhuma. A Sra. Bhutto defendia, de facto, posições que em tudo agradavam ao Ocidente, mormente a de uma gradual aproximação à Índia, o que implicava uma diminuição do apoio aos separatistas de Caxemira. Contudo, esta foi também a mulher que, no exílio, forjou um "power-sharing agreement" com o Presidente que, poucas semanas depois, acusou de ser um ditador que não merecia a sua confiança. Argumentarão que, na cena política paquistanesa, a coerência não é o valor mais prezado. Mas não se pode negar que, para o exterior, esse é talvez um dos principais barómetros para se aferir da "adequabilidade" de um candidato.
Dito isto, é evidente que o atentado foi lamentável; que teve e terá consequências profundas na cena política do Paquistão; que o Presidente Musharaf, se já tinha pouca credibilidade interna e externa, agora perdeu definitivamente a que ainda lhe restava; que as eleições de Janeiro serão indubitavelmente influenciadas pelo que aconteceu e que o Ocidente perdeu uma potencial aliada (tenho dúvidas, ainda assim). Penso, contudo, que os riscos propagados de separação do Paquistão são altamente exagerados. Tumultos políticos já o país teve vários e não foi por isso que se fragmentou (excluindo, evidentemente, o caso do Bangladesh, que não é comparável à situação actual). O exército não só não o permitirá, como aqueles que se dizem interessados nisso sabem bem que não teriam qualquer sucesso / apelo / raison d'être caso tal viesse a acontecer.
Em suma, a morte da Sra. Bhutto é apenas mais um triste episódio, que, infelizmente, não penso que venha a ser o último com que o Paquistão nos brindará.
quinta-feira, 27 de dezembro de 2007
Uma vítima a mais
Este é dos acontecimentos mais graves de 2007, sem margem para dúvida. O Ocidente quis à viva força que o regime paquistanês se aligeirasse, que Musharraf despisse o uniforme, que o Paquistão reencontrasse alguma normalidade democrática. Eu não digo que esteja errado, mas acho sempre esquisita a imagem de generais a despirem as fardas. Adiante.
A morte da Sra. Bhutto é, em boa medida, a morte de Pervez Musharraf. A ditadura paquistanesa encontrava água para se lavar aos olhos da comunidade internacional, e mesmo internamente, por representar um sistema eficaz de oposição ao extremismo islâmico e por ser um aliado dos Ocidentais no Afeganistão.
Um rotundo fracasso, não vos parece? Eis o Paquistão mergulhado em semi-insurreição, o seu governo desacreditado e cadáveres pelas ruas das cidades. A campanha eleitoral já tinha sido o que foi, e agora isto. Não acredito que haja muita boa vontade em Washington, ou onde quer que seja, para com o General de Islamabad, e imagino que se esteja a preparar uma transmissão de poder tranquilo, que não pareça uma demissão, e um exílio razoável para ele. O substituto? Um outro general, alguém de desconhecido no exterior e de reputação sólida entre as Forças Armadas paquistanesas. Alguém que não desiluda as bases do poder, e isso inclui os EUA.
Tudo isto são adivinhas, mas parecem-me adivinhas razoáveis. Se o Paquistão se afundar na anarquia, ou na insurreição concertada, será o terceiro vizinho do Irão a ir abaixo, sem um governo capaz nem ordem interna razoável. É mau para todos, e especialmente mau para o Ocidente. Não há muitas escolhas para além de apoiar qualquer governo forte no Paquistão, com o consequente descrédito para a nossa própria fé na democracia representativa nos países de tradição islâmica.
quarta-feira, 19 de dezembro de 2007
Não estou satisfeito com este senhor
terça-feira, 18 de dezembro de 2007
segunda-feira, 17 de dezembro de 2007
Última hora
EUA, Rússia e Jogo de Soma Zero
Da ocidental praia lusitana
sábado, 15 de dezembro de 2007
Uma menção ao Tratado de Lisboa, porque compete
quarta-feira, 12 de dezembro de 2007
Um acordo, para não se falar apenas do Tratado
O acordo ortográfico, este último de que se fala, levanta, como de costume, celeuma em Portugal, e aqui deixo o último artigo sobre o assunto. No Brasil, suponho que não, pelo motivo de que o Brasil tem mais com que se preocupar e porque é o principal beneficiado em deixar correr o marfim. Em Portugal não gostamos (fora quem quer que tenha negociado o dito) sequer que se fale em acordo ortográfico. E porquê? Porque não queremos passar a escrever como se escreve no Brasil. Não queremos mudar a ortografia de 8% das nossas palavras, não queremos escrever "ator". Só por isso.
A coisa seria menos grave se não representasse, ainda por cima, um prejuízo grave para as editoras portuguesas que teriam de reimprimir os livros destinados a todo o Mundo Lusófono (desculpem, não resisti) para se adequarem ao Acordo, enquanto as editoras brasileiras não. Sabe a esforço desproporcionado e, ainda por cima, inglório. Mais vale não fazer, a sério.
Consola-me a sensação de que, como em todos os anteriores, este acordo vai ser letra morta. Vai valer menos que as folhinhas de papel em que está escrito e garatujado no final. Porque é daquelas leis sem eficácia social. Pode ser aprovada, referendada, promulgada e publicada em todos os trâmites e mais algum. Mas os destinatários não a querem aplicar. Maçada...
E tudo isto é escrito, para mais, com a perfeita noção de que a promoção da Lusofonia é e deve continuar a ser uma das primeiras directrizes da política externa portuguesa; que a nossa luta para fazer do português uma das línguas de trabalho da ONU, e que esse português será certamente o do Brasil, é justa e terá resultados; que é graças ao Brasil que o português é uma das línguas mais faladas no Mundo; que tudo se deve fazer para reforçar o estatuto do português como língua quotidiana e de cultura na América do Sul, na África e, com maior custo, já se sabe, na Europa e na Ásia.
A minha única achega a tudo isto é que empobrecer a Língua, harmonizando-a artificialmente, contra a prática e contra o sentimento de tantos, não contribui para estes objectivos.
segunda-feira, 10 de dezembro de 2007
Para o Kosovo e em força
domingo, 9 de dezembro de 2007
A Cimeira em imagens
Uma das grandes vitórias da Cimeira UE-África foi conseguir atrair a participação da sociedade civil internacional. Na foto a estrela rock Bono, visivelmente cansado depois de ter estado a vender T-shirts encarnadas da GAP a US$ 500 a oligarcas russos.
b) A Secretária de Estado para o Desenvolvimento Internacional do Reino Unido;
d) A presidente da Libéria, única mulher Chefe de Estado no Continente.
"Porreiro, pá!"
"Agora é o Tratado, pá."
"Eh pá, vamos a isso. Achas que o Brown vem?"
"Não sei, pá. Mas se quiser mandar a Secretária de Estado dele também pode."
A tríade está completa
quarta-feira, 5 de dezembro de 2007
Afinal de contas, parece que não!
Agora é o US National Intelligence Estimate (NIE) a afirmar que o Irão parou com os trabalhos no seu programa nuclear em 2003...
Pois... parece então que afinal de contas... o tipo lá do Irão... pois... e coiso e tal... não está a produzir uma bomba... Ahhh, certo... hummmmm.....
segunda-feira, 3 de dezembro de 2007
Um parto difícil
A Cuba de Raúl... é a 'China do Caribe'!
http://www.plazapublica.org/articulo.php?id=589&h=343&w=310&sz=36&hl=pt-PT&start=28&um=1&tbnid=NoPmuYU2Of5t8M:&tbnh=120&tbnw=108&prev=
Cuba quer parcerias que lhe dêem expertise para:
- explorar petróleo em águas profundas, no Golfo do México. A nossa GALP está a ficar uma expert... pode ser interessante...
- em transportes, quer melhorar a qualidade de rodovias e ferrovias. Pode ser que a BRISA esteja interessada...
- em turismo, o objetivo é atrair investimentos que complementem os hotéis, de forma a posicionar Cuba no mercado turístico caribenho. Na lista estão a construção de campos de golfe, marinas e parques temáticos e aquáticos e a descentralização dos hotéis, com o potencial de 30 mil novos quartos. De sua parte, o Estado acelerou os investimentos na restauração das edificações coloniais e está reformando lojas e edifícios no centro histórico, que estão sendo transformados em minishoppings e abrigando escritórios.
O governo diz ter trunfos para virar o jogo.
- Temos a oferecer garantia de dividendos livres de impostos, alíquotas menores de importação (de insumos) para construção e produção em Cuba, meio de transporte (são quatro grandes portos e uma razoável malha ferroviária), mão-de-obra formada e excelente posição geográfica - afirma Anaiza Rodríguez, diretora de Avaliação e Gestão de Projetos de Investimento do Minvec.
Como dizia o nosso Fernando Peça, "E esta hein?!?"
Nem alívio nem democracia
sexta-feira, 30 de novembro de 2007
O Ártico
É sabido que os russos estão a treinar ursos polares para colocar bandeiras em titânio e matrioscas em folha de Flandres por todo o leito do Oceano Ártico. Este é uma fotografia raríssima, obtida pelo Conserto das Nações a partir de uma fonte que protegeremos enquanto não for demasiado doloroso, de uma sessão de treino desse projecto.
Dá trabalho, mas deve compensar
A Conferência de Annapolis e a sua lista de participantes são disto um exemplo. Ninguém esperava que desta reunião saísse uma solução final para o Processo de Paz do Médio Oriente. Contudo, o facto de se terem sentado à mesma mesa países e respectivos dirigentes com visões diametralmente opostas e antagónicas (mesmo que não se cumprimentando entre si), é um bom sinal. Deu-se início (como parece sempre acontecer no final do mandato dos Presidentes dos EUA) a um processo em que as partes se comprometeram a discutir e a dialogar. Tenho dúvidas sobre o seu sucesso, mas sempre é melhor que nada. De facto, olhando para o Médio Oriente, fico um pouco como o outro, que vai para a cama idealista, mas se levanta realista.
Digno de nota é o convite à Síria, um Estado que os EUA não se cansam de rotular como patrocinador do terrorismo. Representada a nível de Vice-MNE, a Síria não estará de regresso ao Concerto das Nações, mas deu, certamente, um bom passo para se certificar de que, havendo desenvolvimentos, será parte deles e não um mero espectador.
Este é, a meu ver, um bom princípio em relações internacionais: mais vale dialogar do que, pura e simplesmente, ignorar Estados que têm influência (goste-se ou não) na possível resolução de um problema. Esta abordagem terá, certamente, os seus limites: it takes two to tango, como bem se sabe. Mas, normalmente, países como a Síria preferem ser vistos como partes de um processo do que ignorados e postos de lado - estratégia que, normalmente, não dá bons resultados.
quinta-feira, 29 de novembro de 2007
Com amigos destes
Este não é, pois, o momento de fazer balanços. Mas já há sinais do que poderá vir a acontecer no próximo ano. A Eslovénia ocupará a Presidência no 1º Semestre e a França no 2º. Este post deve-se a Paris. Nas vésperas da Cimeira UE-China, o Presidente Sarkozy foi a Pequim transmitir as preocupações francesas com o crescente défice comercial entre a UE e a China e com a não valorização do yuan. Foram também estas as mensagens que Sócrates transmitiu ao PM Chinês ontem. Este tipo de atitude não fica bem Paris, não valoriza a tão procurada imagem de coerência externa da União, nem ajuda à sua credibilização face a países terceiros.
Em política externa, não deveria haver lugar a invejas ou precipitações. Sarkozy é as duas: invejoso e precipitado. Duvido que o resultado, no 2º Semestre, venha a ser famoso.
Dia 2...
Na Rússia, haverá eleições para a Duma. Para aqueles que ainda pensam no país de Putin como uma democracia, vale a pena ler isto. Duvido que na Venezuela seja muito diferente.
Ser democrata não é só ganhar eleições. É permitir que todos expressem as suas opiniões, que os meios de comunicação social sejam livres de fazer as suas opções editoriais, que ninguém seja intimidado a votar num determinado partido.
quarta-feira, 28 de novembro de 2007
Só para contrariar
"Polícias beijando-se", obra do colectivo Blue Noses, 2005
São dois polícias russos, claro. A II Guerra Fria é do pior que há, e pior ainda é que se reúnem todos os ingredientes, incluindo a convicção plena de que é o outro lado que alimenta a questão com as suas atitudes intolerantes e anacrónicas. Temos de dar a volta a isto... Mas antes disso vou publicar a fotografia outra vez!
P.S.: Um dia este blogue terá, esteticamente, o cuidado e o gosto de um Je Maintiendrai ou de um O Jansenista. Por enquanto, a gerência lamenta quaisquer inconvenientes.
P.S. 2: O blogue do José Milhazes, Da Rússia, torna-se leitura imprescindível para saber, em primeiríssima mão, aquilo que por lá se passa. Para mim, informação inestimável.
segunda-feira, 26 de novembro de 2007
Contagem decrescente
Agora as coisas precipitam-se, e posso bem dizer-vos que, se a UE não adopta uma posição mais firme, e através da sua Presidência - i.e., Portugal - estará, uma vez mais e sem a ajuda de mais ninguém, a rotular-se a si própria de sociedade comercial e nada mais, de tigre de papel, de anão político, de algo ainda abaixo de sócio minoritário dos EUA.
E já nem falo de impedir a declaração de independência do Kosovo, no próximo dia 10 de Dezembro, porque essa batalha, apesar de ser a certa, parece já perdida para os radicais. Falo do dia seguinte, e das semanas seguintes. Que ninguém reconheça a independência unilateralmente declarada do Kosovo, ponto final, para que esta tenha o valor das declarações de independência da Abcázia e da Ossétia e da Inguchétia e da Transdnístria, e se os EUA quiserem reconhecê-los, então bom proveito. «Não alinhamos com este género de actuação, que é a desaquada às circunstâncias e a menos construtiva de todas.» Uma mensagem simples e inequívoca - seria um bom serviço que a Presidência Portuguesa prestaria à Europa e a Portugal.
Entretanto, e como operação de psicologia de guerra, distribuir gratuitamente a sérvios e kosovares o single, mesmo que em 45 rotações, deste hino à paciência como grande virtude cardeal:
Eu ouço e ouço e ouço, e parece-me útil.
domingo, 25 de novembro de 2007
Uma satisfação meio tola, mas uma satisfação
A Galp e a PDVSA assinaram um acordo de cooperação para explorar gás e petróleo na Venezuela, e agora há grandes planos de intercâmbio económico. Houve mediação de Mário Soares, houve negociações de bastidores, houve, julgo eu, um prazer perverso da parte dos decisores nacionais em consorciarem-se com um dos elementos do Eixo da Irritação. Esta é a parte mais ou menos ligeira da coisa. Já agora, fica aqui o mapa da República Bolivariana para que o leitor se situe na dita, com a região dos depósitos de petróleo a vermelho e os depósitos de gás a azul - grosso modo, que eu não grande coisa com o Paint.
Agora vem a parte que dá o título ao remendo. Foi-me despertada com este artigo do El País, em que se dá um destaque especial a esta manobra da diplomacia económica lusitana. A meu ver, não há que fazer grande estardalhaço em torno disto, embora qualquer movimentação portuguesa que provoque estardalhaço, mesmo que só em Espanha, já valha qualquer coisa.
No entanto, é mesmo um fogo fátuo: Espanha e Venezuela vivem o momento que todos conhecemos, e que o Sebastião já referiu em remendo anterior; depois, porque duas empresas petrolíferas a fazer negócio devia ser business as usual - ou um contrato da BP é brindado com Murganheira em Downing Street? - e por fim, porque o correspondente do El País em Portugal, o Miguel Mora, não é, salvo o devido respeito, o mais sensível dos relatores. Mas esta impressão é puramente minha.
Claro que virão dizer que Portugal anda a meter-se com quem não deve, com inimigos do Ocidente, com ditadores populistas demagogos, que estamos a pactuar com os desmandos e com as perfeitas imbecilidades do regime chavista. E se calhar até estamos, até certo ponto.
Sucede que há cerca de 1.200.000 portugueses e luso-descendentes na Venezuela, em quem há que pensar, se não queremos só brincar aos países ou às regiões autónomas europeias (nem digo espanholas...), e que, pela posição particular que ocupam na economia venezuelana, são alvos tentadores para a Revolução Bolivariana; há uma perspectiva de bons negócios para a Galp e de diversificação do abastecimento energético (e isso é importante, e todos os grilos falantes deste mundo também pensam nisso) e, por fim, há esta imagem: Portugal compra a esmagadora maioria do seu petróleo a dois países, nenhum deles monumentos à democracia liberal e participativa - a Nigéria e Angola. É caricato, mas em pergaminhos democráticos o senhor Chávez até possa pedir meças aos nossos outros fornecedores. Mas vem aí o Brasil para redimir-nos!
sábado, 24 de novembro de 2007
A arma secreta - e derradeira
As primárias no Iowa são a 3 de Dezembro. Já falta mesmo pouco. Espero que o tema se torne um pouco mais recorrente aqui no Conserto. Ó Sebastião, e se fizéssemos um bocadinho de campanha, assim só na brincadeira?
E já agora... este remendo é inteiramente "Chuck approved" - de outra forma, o Chuck já teria saltado do écrã para dar-me meia dúzia de pontapés giratórios.
quarta-feira, 21 de novembro de 2007
Estéticas georgianas
sexta-feira, 16 de novembro de 2007
Vale a pena ler
quarta-feira, 14 de novembro de 2007
Um debate interessante
terça-feira, 13 de novembro de 2007
Para nosso divertimento...
O Rei esteve bem, muito bem! Já é suficiente que o Sr. Chavéz se julgue o salvador popular do povo da Venezuela, suportado por petro-dólares, era o que faltava que agora insultasse pessoas democraticamente eleitas num Estado de Direito e ninguém lhe dissesse nada, a bem de um tão propalado complexo de esquerda, tão marcadamente europeu. O Rei não sucumbiu a essa fraqueza e impôs-se. E bem!
quinta-feira, 8 de novembro de 2007
The French fries are back
Acho esta aproximação uma boa notícia. O Presidente Chirac não era, em termos de política externa, um actor muito recomendável - digo isto não tanto pelo princípio de oposição à guerra do Iraque, mas pela forma como ele foi encarado, defendido e apregoado (a emancipação da Europa face aos ditames do Império). Isto para não falar da associação ao Sr. Putin - um arauto do que de melhor existe no código genético da Europa, como sabemos.
O Sr. Sarkozy, que pessoalmente não me inspira particular simpatia, cedo se apercebeu, contudo, que os EUA são incontornáveis para a Europa, se esta quiser continuar a ter algum relevo internacional. Washington, sublinhe-se, sempre soube isto (a relação não é unívoca, como comummente se pensa).
A visita a Washington e a ovação de pé que recebeu no discurso do Congresso (quando lá foi o Sr. Chirac, ainda antes do Iraque, houve congressistas que recusaram marcar presença), para não falar do seu conteúdo, que me pareceu apropriado (apoio à guerra no Afeganistão, menção clara da posição francesa de oposição a um Irão nuclear e eventual regresso à estrutura militar conjunta da OTAN), são, por isso, boas notícias.
A Europa e os EUA fazem parte de uma comunidade de valores e, por isso, são mais fortes juntas do que separadas. Não significa isto, contudo, que deva haver políticas de mero seguidismo (mais tradicionais neste lado do Atlântico, convenhamos), como alguns, demogogicamente, tentam fazer crer quando se fala numa relação privilegiada entre a Europa e os EUA.
quarta-feira, 7 de novembro de 2007
Uma tortilha em Melilha
terça-feira, 6 de novembro de 2007
Os consensos europeus
domingo, 4 de novembro de 2007
A excepção cultural francesa
A França não é um país detestável, povoado por gente do pior que há. Pode haver quem pense isso, mas não eu. Em França há coisas absolutamente maravilhosas, quem sabe a principal sendo a língua francesa. O problema com a França é que quem a governa perde a sua credibilidade com demasiada facilidade, mas continua a agir como se nada se passasse. E nós, os que achamos que a França é demasiado importante para a Europa e para o Mundo para se comportar desta forma, deixamos passar. Não pode ser. A França precisa de tough love. Perdão, amour inflexible.
A França do Presidente Sarkozy tem-nos presenteado, neste últimos seis meses, com activismo, liderança, protagonismo, hiper-actividade, "o regresso à política pura", disse-se. Pois sim, talvez. Este seu governo age baseando-se numa ideia de França que é belíssima: ideais universais, uma visão alternativa (julgo que mais simpática e socializante) do capitalismo anglo-saxão e, claro, la gloire. É uma boa base emocional e intelectual para apresentar ao mundo como distintiva da França e ao mesmo tempo como base de uma política externa. E apesar de tudo, aconteceram, e acontecerão, coisas destas:
Nunca mais me esqueci desta nota de rodapé nos jornais. Países mais importantes estavam a atacar e a ser atacados e mereciam bem mais a nossa atenção e o nosso apoio ou repúdio, conforme. Rebentar com a Força Aérea de uma ex-colónia no coração das trevas não conta. Este fenómeno, que cabe mais no rol das opere buffe (em português é cacofónico) do que nas páginas da História, descredibiliza a França - pelo menos é a única conclusão que eu retiro destes episódios e de quem os ordena, na época em que os ordena.
Ocorreu-me tudo isto quando soube que o presidente Sarkozy vai a N'Djamena - sem Cécilia, atenção - negociar a libertação dos europeus implicados no caso "Arca de Zoé", algo de tão tamanhamente sórdido que nem eu me disponho a explorar. Fica aqui a ligação para a notícia mais próxima da fonte: http://www.lemonde.fr/web/article/0,1-0@2-3224,36-974348@51-963882,0.html. Desejo-lhe sorte, e não me surpreende que os franceses tenham do sistema jurídico do Chade a imagem que os ingleses têm do sistema jurídico português. Mas é ou não verdade que o episódio das enfermeiras búlgaras também abalou a credibilidade (pela manha rasteirinha, e ainda por cima bem planeada de antemão para a publicidade) do presidente Sarko?
sábado, 3 de novembro de 2007
Ainda não nos esquecemos
Uma nota, no entanto: uma ditadura militar não pode sobreviver se for unicamente baseada no apoio ou na complacência estrangeira. Suponho que tenha de haver muitos birmaneses civis a aceitar e a apoiar o regime. A Indonésia, para dar um exemplo da região, também era uma ditadura militar, e muitos outros exemplos haverá.
sexta-feira, 2 de novembro de 2007
Jornalismo de intervenção
Homem a cavalo: "Soldados, o vosso objectivo é o Norte do Iraque! Em frente, maaaarche!"
Soldado 1: "Mas quem é este gajo? É um general?"
Soldado 2: "Náá - jornalista."
Retirado do muito interessante Istanbul la Turque.
O estudo da influência da Imprensa na definição e condução da política externa, e também das relações entre diplomatas, políticos e jornalistas, é apaixonante, e é algo que merece toda a atenção de quem se interessa pelos destino do seu país. Fenómeno ao mesmo tempo de manipulação das emoções massificadas e de passagem de mensagens mais subtis, encontramos os seus antecedentes mais imediatos nas guerras da unificação alemã (dos Ducados, Austro-Prussiana e Franco-Prussiana), em que o Chanceler Bismark utilizou não só a imprensa do seu país, mas em larga medida a alheia, para desencadear os acontecimentos que serviam os seus propósitos.
O exemplo clássico de uma guerra fabricada pelo spin jornalístico é a Hispano-Americana de 1898. Sobre essa guerra tão ignorada em Portugal vale a pena ler alguns capítulos de "Espanã en 1898, claves del desastre", (Galaxia Gutemberg - Círculo de Leitores) sob a coordenação de Pedro Laín Entralgo e Carlos Seco Serrano.
Em democracia, a política externa já não é coutada das chancelarias, nem de uma casta de entendidos... Mas não é, nem pode ser, um assunto como outro qualquer nas redacções ou nas régies. Todos os implicados precisam de tratar-se uns aos outros com luvas de pelica, sobretudo quando há vidas em jogo.
quinta-feira, 1 de novembro de 2007
Um mundo que nos separa
Há direita religiosa que não vota Bush
http://www.timesonline.co.uk/tol/news/world/us_and_americas/article2783974.ece
Quem quiser saber mais (há pior que isto, acreditem), vá aqui.
Este é, provavelmente, o remendo mais desmiolado até agora no blogue, ultrapassando aquele em que fui dado como apoiante de base do candidato Dennis Kucinich. Por acaso vale a pena voltar a essa ligação, à medida que as primárias do Iowa se aproximam (3 de Janeiro) e a super-potência vai a votos.
Com este remendo espero contribuir para dar um pouquinho de surreal aos dias dos leitores d'O Conserto das Nações. Abraços e agradecimentos a todos, a ponderação e a realidade recomeçam dentro de momentos.
segunda-feira, 29 de outubro de 2007
Como não sou egoísta...
É capaz de ser dos mais completos do género com a vantagem de ser meramente factual. Apresenta factos, dados, análises, sempre com absoluta isenção. Claro que sendo norte-americano, tende a recolher material de interesse estratégico norte-americano.
Mas melhor do que a minha descrição, é ler esta informação sobre uma região que está na berra, mesmo que os jornais nacionais e internacionais (que se repetem uns aos outros, numa orgia auto-fágica de informação) estejam "a leste" do que realmente se passa na região.
http://www.globalsecurity.org/military/world/iraq/kirkuk.htm
e sobre os players em campo... http://www.asianews.it/view.php?l=en&art=6885
e voltar à consulta do site... http://www.globalsecurity.org/military/industry/halliburton.htm
Explorem este site... são horas de diversão e informação!!!!
Outra chatice...
domingo, 28 de outubro de 2007
Há limites
Este remendo versa a vindoura Cimeira UE-África, e a a maçada que é para a nossa Presidência da UE, que tem dados aqueles frutos que gostamos de ostentar, como a Cimeira UE-Brasil e a assinatura do Tratado, e que até tem servido para projectar uma imagem bastante positiva da nossa terra; a maçada, dizia, que é para a nossa Presidência o regime do Sr. Mugabe ainda existir.
Maça também a insistência asinina dos regimes africanos em alinhar e respaldar com a sua solidariedade o regime bestial (de besta, mesmo) que o referido Sr. instaurou naquele país; não sei se alguém já lhes chamou a atenção para o facto de que associar-se a um regime moribundo pega mal e só demonstra a escassa esperança de vida daqueles que se lhe associam. "Ah, são imperativos de política interna, têm de mostrar-se solidários." A política externa também tem imperativos, e não menos prementes que os internos - têm é de ser tornados bem claros.
Maçam também os Estados-membros que, fora o Reino Unido, dizem que não vêm a uma Cimeira onde haja ditadores. Pois claro, há grilinhos falantes que nos arengam do alto de elevadíssmos padrões civilizacionais. Está tudo dito quanto a esses nossos irmãos comunitários.
Há limites para o grau de desonra que podemos aceitar; é que quem nos atrapalha mais este pequeno êxito de que alimentam as políticas externas dos países (mais) pequenos, é esta gente.
Há também um serviço de informações que poderia dedicar-se, entre outras actividades, a causar acidentes apenas ligeiramente incapacitantes a ditadores execráveis, sem que o Mundo ficasse infinitamente mais pobre por isso. Estarei a exagerar?
Regressando à Terra, desta questiúncula desagradável podemos retirar a conclusão, triste, de que nem Portugal, nem outros intervenientes tradicionais na área (o Reino Unido), nem mesmo a UE enquanto tal tem influência ou poder de dissuasão suficiente para fazer desta Cimeira um êxito, como conviria. Conviria a Portugal, primeiro que tudo, e conviria aos Estados africanos. Não que da Cimeira fossem resultar grandes soluções para os problemas globais, mas como sinal de compromisso e mesmo de respeitabilidade de quem nela participasse.
Ou então a realização da Cimeira só convém mesmo a Portugal, porque quer mais uma estrelinha na constelação da sua Presidência, e há outros que ou não estão nem aí ou que querem organizar a conferência na sua Presidência, enquanto ela é rotativa. Talvez não seja a Eslovénia, no entanto.
Por último, resta-me aplaudir (sinceramente) a coragem do nosso Executivo ao planear a Cimeira. Foi uma aposta, e ainda vai a tempo de correr bem, mas pode muito bem dar para o torto. Acredito que, ao planear a Presidência, tenham pensado "em Dezembro de 2007 o homem ou já morreu ou o regime caiu". E teriam fundamento para acreditar nisso. Mas não. O regime arrasta-se, entre decretos a cortar a inflação para metade (para uns 4000% ao ano) e entre ajustes de contas tribais. Quanto mais escrevo mais me convenço de que há limites. Esperemos pelo melhor.
terça-feira, 23 de outubro de 2007
Um ventinho frio
Serguei Lavrov, em entrevista por escrito exclusiva à Agência Lusa e pesando o actual estado das relações entre o seu país e Bruxelas, sublinha que, devido aos alargamentos, a União Europeia (UE) se tornou “menos uniforme”. “As últimas decisões da UE fixaram essa heterogeneidade”, assegura o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, expressando o “desejo sincero” de que os 27 superem a “doença de crescimento” para formarem “um sistema harmonioso de tomada de decisões sobre o seu posterior desenvolvimento”. “Uma UE forte, eficaz, que não permita o recuo para o passado nacionalista e populista, corresponderia (…) aos interesses (…) dos seus parceiros, incluindo a Rússia”, garante.
- A Rússia não gosta de qualquer alargamento da UE, como não gostou do desmantelamento do "talude soviético", nas suas vertentes política, militar, económica e cultural. Qualquer ex-Estado satélite que se junte ou à UE ou à NATO é sentido como uma derrota em Moscovo. Talvez vá além da racionalidade, esta reacção, e acho-a compreensível. A perspectiva de Moscovo parece ser esta: os Estados da Europa Central/Oriental pertenciam a um bloco político-estratégico, agora pertencem a outro; os blocos opõem-se, é essa a sua natureza e propósito, e desta perspectiva crua de política de poder Moscovo não sai. Daí vir dizer-nos que a UE é "heterogénea", que há elementos muito diferentes, que chocam, e cuja assimilação vai levar tempo antes de novo alargamento... "Não façam novos alargamentos, tenham calma..."
- E quanto a passados nacionalistas e populistas, o MNE russo está bem habilitado a falar, porque vive num país em que nacionalismo e populismo são o presente. Mas o de alguns EM da UE (não digo nomes) são maus e agressivos, e o da Rússia é justo, bom, belo e defensivo.
Lavrov discorda do facto de a “solidariedade europeísta” ser “frequentemente utilizada para exercer pressão sobre a Rússia”, visando “arrancar cedências políticas, ou económicas” nas suas relações com terceiros. “Semelhante atitude de alguns países comunitários não é claramente construtiva”, lamenta, admitindo que “não contribui para a solução dos problemas” e até divide as “próprias fileiras” da UE. “A solidariedade europeia não deve ser uma amizade contra alguém, pelo contrário", precisa.
- Cá está: a Rússia defende apenas o que é seu. Vê-se rodeada de gente poderosa e ávida de riquezas (como bálticos e caucasianos, por exemplo), e precisa de defender-se. A UE pressiona, quase violenta a Rússia, ao exigir estabilidade no fornecimento de gás e de petróleo e reciprocidade no tratamento às empresas; a UE repudia truques sujos como "avarias" em oleodutos e pirataria informática a EM que desagradam a Moscovo. Mas não devia nem exigir nem repudiar, porque a Rússia só se defende.
- A UE divide-se a si própria, outra grande verdade. Algo de que, ao acontecer efectivamente (Nord-Stream, carne polaca), a Rússia não se aproveita nem manipula para sua vantagem. Até parece que as boas práticas estão do lado da Rússia.
No entanto, Lavrov frisa que “a Rússia, ao realizar a “opção europeia”, deve “conservar a liberdade de definição e realização da sua política interna e externa”. Moscovo - adianta - está “interessada na manutenção e desenvolvimento multilateral das relações com os países da Comunidade de Estados Independentes (CEI) - formada pelas antigas repúblicas soviéticas, menos as bálticas Estónia, Letónia e Lituânia -, com os Estados Unidos, China, Índia e com os novos centros mundiais emergentes na região do Sudeste da Ásia”, o que corresponde igualmente aos interesses da UE.
- A Rússia é um pólo em si mesma, já sabemos, e já sabemos que a Rússia não vai deixar ninguém intrometer-se nas suas políticas interna ou externa, porque a Rússia é maior e mais forte e está a defender-se. E a CEI é território off limits para vocês.
O chefe da diplomacia de Moscovo recorda que o Presidente Vladimir Putin, num texto de Março dedicado ao 50.º aniversário do Tratado de Roma, concluía não poder “existir uma completa unidade do (…) continente enquanto a Rússia não se tornar parte orgânica do processo europeu”. “A interdependência positiva no sector energético (…) cria boas premissas para a posterior aproximação em todas as outras áreas de cooperação”, conclui Lavrov.
- Que «parte orgânica» é esta que não abdica de liberdade nas políticas interna e externa? E se quanto à interdependência energética estamos mais que esclarecidos, esta é tão positiva, mas tão positiva, que já nos pôs a todos na UE a pensar em renováveis, em projectos de partilha estratégica de recursos e em alternativas desesperadas aos hidrocarbonetos russos. Mas é verdade que, havendo confiança e estabilidade nessa área, outras poderão seguir-se. É só passar dois ou três Natais sem ameaçar fechar a torneira.
O tom do remendo é beligerante, eu admito, e explica-se essencialmente através de duas frustrações: a primeira, que é a de já não se conseguir saber quem começou a provocar quem e quem falhou em primeiro lugar a aproximação, que entendo tão útil e desejável, entre a Europa Ocidental e a Rússia; a segunda, é a de ver na Rússia todo o potencial e capacidade para gerar esse mesmo entendimento, mas não o fazer por opções (ou imperativos) de política interna e de conservação da estrutura de poder. A Rússia sairia reforçada de um relacionamento próximo e franco com a Europa Ocidental; prefere desperdiçar as suas - e as nossas - energias em confrontos.